sábado, 24 de junho de 2017

Resumindo o pensamento de Aristóteles.



(P.97) Cap. 04: Ille Philosophus. Aristóteles.
(P.98) “Foi por conta do espanto e do assombro que os homens começaram a filosofar – e, pelo mesmo motivo, filosofam até hoje” Aristóteles.
(P.99) Aristóteles.
Nascido em 384 a.C. na cidade de Estagira, em uma família tradicional – e mitológica – de médicos.
Enquanto Pitágoras e Platão tinham uma tendência ao misticismo, Aristóteles utilizava-se de uma espécie de pensamento científico.
(P.100) Chegou em Atenas com 17 anos e ingressou na academia de Platão, na época com 70 anos.  A relação amistosa entre professor e aluno com o tempo deteriorou-se por diversos motivos, entre eles o fato de que Platão reverenciava seu mestre, Sócrates, enquanto Aristóteles nem tanto. Lembrando que os dois tinha 50 anos de diferença.
(P.101) Pouco antes da morte de Platão, Aristóteles saiu de Atenas (347 a.C.), e em 343 a.C. recebeu o convite de Filipe II – rei da Macedônia – para educar seu filho Alexandre. Egito que desempenhou com grande destreza até o assassinato de Filipe II e a ascensão de Alexandre.
(P.102) Em 334 a.C, Aristóteles voltou a Atenas – que agora era parte do Império Macedônico. Os orgulhosos atenienses não aceitavam isso de bom grado e o rancor contra Alexandre respingava contra Aristóteles. Mesmo assim ele criou a escola de ciência e filosofia que ficou conhecida como Liceu.
(P.103) Enquanto a academia platônica dedicava-se principalmente a matemática, a escola de Aristóteles – também chamada de escola peripatética – inclinava-se a biologia e as ciência naturais.
Enquanto Platão negava esse mundo, Aristóteles tinha fascínio por tudo o que existisse: nada era tão insignificante que não merecesse sua curiosidade.
Platão desprezava a observação, por vir dos sentidos. Aristóteles procura integrar a percepção do mundo sensível ao conhecimento filosófico.
(P.104) Aristóteles buscou abraçar o maior conhecimento possível sobre tudo e apesar de cometer erros crassos – lembrando que os únicos instrumentos que possuía era a régua e o compasso – suas obras são uma das maravilhas do intelecto humano.
(P.106) Com a morte prematura de Alexandre, antigos rancores caíram sobre Aristóteles que teve que se exilar e morreu meses depois, por suicídio de cicuta.
O nascimento da lógica.
(P.107) São inúmeras as contribuições de Aristóteles para a filosofia e a cultura ocidental. Uma delas foi a elaboração do pensamento lógico. Lógica é a técnica, arte ou método do pensamento correto.
O estudo da lógica é árduo, mas compensador: com a prática ela se torna uma segunda natureza da mente e nos ajuda a ver a diferença entre aquilo que sabemos e aquilo que pensamos saber.
(P.108) Os seis tratados de lógica aristotélica, ficaram conhecidos como Organon. Que ao ser traduzido do grego para o latim tornou-se a base da filosofia medieval.
Vimos que Platão desprezava os sentidos. Aristóteles pelo contrário acreditava que o conhecimento só pode começar pelos sentidos; não porque eles sejam totalmente confiáveis, mas porque não dispomos de outro ponto de partida.
De tanta observarmos o mundo conseguimos usar a imaginação que gera o que Aristóteles chamou de indução sobre as coisas. Ex: de tanto observamos árvores, sabemos que todas as árvores têm raízes. Podemos concluir de forma indutiva.
(P.109) Naturalmente, em todo o processo indutivo suspendemos por um momento a descrença – há uma aceitação ao senso comum. Pois, para termos certeza absoluta de que “todas as árvores têm raízes” teríamos que observar cada árvore do mundo.
O que a indução produz não são verdades finais, mas verdades provisórias (axiomas) que podem ser revistas caso surja um elemento novo. A partir dos axiomas, seguimos o caminho inverso, se na indução buscamos a generalização, agora vamos em busca de fatos específicos (dedução).
Com base nisso Aristóteles elabora o silogismo que é o conjunto de três afirmações: duas premissas e uma conclusão. Gerando a consequência lógica entre as premissas e sua conclusão.
Premissa I
Todos os seres humanos são mortais.
Premissa II
Sócrates é um ser humano
Conclusão
Logo, Sócrates é mortal
(P.110) O silogismo é uma forma de coerência interna que por si só não é garantia de verdade.
O terceiro passo do silogismo depende dos dois primeiros; se uma das premissas for falsa, o mecanismo produzirá uma falsidade com aspecto de razão.
A metafísica.
Em grego significa “depois da física”. Metafísica é muito difícil de ser definida, de forma básica é a reflexão sobre a natureza fundamental da realidade. A ciência faz isso, mas o conhecimento científico busca verdades concretas, já a metafísica é mais abstrata.
(P.111) Não posso colocar o Ser e a Existência sob a lâmina de um microscópio. Não posso fazer a autópsia no conceito de passado, nem medir a temperatura do futuro, etc. Enquanto a ciência é empírica a metafísica faz experimentos mentais.
Ela parte de perguntas muito simples: o que é um círculo? O que é um número? Chegando a hipóteses altamente complexas.
A metafísica desafia a superfície familiar das coisas. Quando somos crianças estranhamos tudo, depois perdemos este estranhamento. A metafísica resgata a estranheza.
Aristóteles considerava a metafísica como a primeira filosofia, a base para pensarmos o mundo.
Para Platão, a ideia universal de pedra existe no reino das coisas abstratas, separadamente das pedras individuais do mundo sensível. Aristóteles dizia que as universais existem apenas nas coisas, e não de forma independente. Não há uma pedra universal, mas inúmeros indivíduos por meio dos quais o conceito se manifesta. Esse é o princípio de instanciação: toda propriedade existe por meio de suas instancias, ou exemplos.
Muitas coisas e muitas criaturas podem ser descritas como “vermelhas”; mas a vermelhidão não existe separadamente delas. No entanto, os conceitos universais não são apenas criação subjetiva da menta humana: elas correspondem a algo que está na realidade.
(P.112) Existe uma estrutura universal que faz com que um pássaro seja um pássaro, e que um lagarto seja um lagarto. Dessa forma deve haver um princípio universal que abranja todos os animais; e outro mais abstrato, que envolva todas as criaturas vivas; e por fim um denominador comum entre pássaros e galáxias, musgo e montanha, homens e poeira das estrelas. E essa é a reflexão metafísica: o estudo do ser enquanto ser.
Segundo Aristóteles devemos chegar à estrutura intima de tudo aquilo que existe – só assim teremos certeza de que nossos conceitos correspondem à realidade e não são meras convenções.
Para raciocinar de forma metafísica é preciso investigar o significado exato da palavra ser. Nós à usamos de várias maneiras.
1.      Sócrates é um ser humano;
2.      Sócrates é um filósofo;
3.      Sócrates é feio.
4.      Sócrates é grego.
Em cada frase há um sujeito (Sócrates), e um predicado (algo que é dito sobre o sujeito). Podemos dizer que um mesmo sujeito é diferente coisas. Logo um ser possuí sentidos diversos.
Quando dizemos que Sócrates é humano, estamos nos referindo a algo essencial. As outras afirmações apresentam propriedades que Sócrates tem, mas não poderia ter. Ele poderia ser feio ou bonito, filósofo ou marceneiro, grego ou egípcio se não fosse primeiramente humano?
(P.113) A frase 1 indica a substância de Sócrates (fixa e inalterável). As outras indicam acidentes.
A pergunta é: quem domina o ser, a substância ou os acidentes? Sócrates ainda seria Sócrates se fosse bonito, marceneiro e egípcio?
Aristóteles ainda tentou resolver o enigma do movimento e da mudança que intrigou os pré-socráticos. Parmênides defendia que toda mudança é ilusória. Heráclito defendia que tudo muda.
Aristóteles defendia os conceitos de ato e potência. Uma coisa nem sempre é o que parece ser: ela pode conter características ou possibilidades que não se apresentam no momento, ele chama isso de potência. A criança é potencialmente um adulto, uma semente é potencialmente uma árvore.
Quando as possibilidades se transformam em fato real, a potência se converte em ato. E a passagem do potencial ao atual explica o movimento do universo. As coisas se transformam até que todas as suas potências se transformem em ato; quando as possibilidades se esgotam, o movimento cessa e a árvore deixa de existir.
Aristóteles também trabalha a questão da causalidade. Para as perguntas “o que é tal coisa?” e “por quê”, existem infinitas respostas possíveis.
·        Ex: após uma noitada, golpeio um de meus amigos e o derrubo. Ele me pergunta “por que você me derrubou?”
·        R: Te derrubei, pois meu braço se deslocou no espaço com uma certa velocidade e bateu em seu peito.
·        R: Te derrubei porque estou bêbado.
·        R: Te derrubei pois, estamos bêbados e você disse algo que me ofendeu.
A última resposta parece ser a mais completa, mas todas são verdadeiras. Assim observamos que existem vários tipos de causas para os eventos que observamos e que toda causa foi causada por uma causa anterior.
Ex: por que derrubei meu amigo? Porque ele falou besteira. Por que ele falou besteira? Por que estamos bêbados? Porque fomos ao bar. Por que fomos ao bar hoje? E assim podemos regressar até o infinito.
Em Ille Philosophus, Aristóteles apresenta quatro tipos de causas e para explicar o autor da o exemplo de uma estátua de bronze de uma bela ninfa.
1.      Causa material: o bronze, pois sem bronze a existência de uma estátua de bronze é inviável.
2.      Causa formal: se o bronze derretido tivesse sido jogado em uma outra forma, a estátua não seria o que é.
3.      Causa eficiente: sem a existência do artista a estátua não existiria.
4.      Causa final: finalidade pela qual uma coisa é feita.
A teoria das causas se interliga à ideia de ato e potência. Um bloco de mármore é uma estátua em potencial; a mão do artista atualiza essa potencialidade, transformando a pedra em uma escultura.
Assim como o escultor atualiza essa potencialidade, Aristóteles acredita na existência de um ser imutável, imortal e irracional que organiza e encontra a potencialidade do universo, ser que ele acredita ser Deus. Deus para ele é o motor imóvel: que origina todo o movimento do universo, mas que não se move e nem se transforma, pois é perfeito em si mesmo.
Quando trata da existência de um ser Supremo, a metafísica dá origem a teologia, que foi a principal preocupação da Idade Média.
Fonte:
BOTELHO, José Francisco. Uma Breve História da Filosofia: São Paulo. Abril. 2015. P.97-118.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

Entendendo Platão em 5 minutos.


Platão
Quem foi? Arístocles ou simplesmente Platão, foi o maior discípulo de Sócrates. De família aristocrata em um primeiro momento foi um entusiasta da democracia, mas aos 20 anos conhece Sócrates e seu entusiasmo pela democracia acaba.
Qual sua importância? Junto com Sócrates e Aristóteles, Platão é um dos pilares do pensamento ocidental. 
O filósofo inglês Alfred North Whitehead (1861-1947) comentou certa vez que a filosofia ocidental consiste em uma série de notas de rodapé referentes à obra de Platão.
Crítico do regime democrático.
A Democracia ateniense não era plena (apenas homens, adultos, livres, filhos de pais e mãe atenienses podiam participar)
A gota d’agua veio quando o regime democrático matou o homem mais inteligente do mundo: Sócrates.
Platão sai de Atenas e vaga pelas polis;
Quase é escravizado ao tentar transformar um rei, num rei filósofo;
Volta para Atenas;
Funda sua Academia (escola socrática);
Escreve A República.
O pensamento de Platão.
A doutrina de Platão gira em torno de duas questões centrais: uma política e outra dialética.
Política: Qual seria a melhor forma de governar os seres humanos?
Dialética: capacidade humana de conhecer o Universo. Como podemos alcançar a verdade fixa e estável, se nossas habilidades em aprender o mundo são limitadas? A dialética é um método para se construir um pensamento mais seguro.
Crítica ao senso comum (doxa).
Diferença entre Ciência e Senso Comum.
Ao aplicar o método dialético a pessoa pode chegar à um conhecimento mais profundo sobre determinado assunto, saindo assim de sua “caverna”.
Dialética Platônica.

É o método criado por ele para se chegar à verdade.
Assim como seu mestre, Platão queria sair do campo das opiniões e chegar a um conhecimento mais elevado, mais sólido.
Criticava os Sofistas (que afirmavam sem provas) utilizando-se apenas de belos discursos.
Seu método utilizava: Tese, antítese e síntese.
Explicação e exemplos.
Apresento uma ideia: tese.
Apresento sua contrária: antítese.
Unindo as duas chego a uma resposta: síntese.
Os conhecimentos parecem opostos, mas não se anulam e sim se complementam numa terceira ideia.
Exemplo: Liberdade. Todos gostam de liberdade, mas sabemos que a liberdade total é ruim.
Sua oposta é a opressão, mas viver sobre opressão é ruim.
Da união entre liberdade e opressão temos as leis, que garante que sua liberdade vai até onde começa a do próximo.
Utilizando-se do método dialético Platão cria sua Teoria das ideias, metafísica e seu famoso mito da caverna.
O que é Metafísica.
Metafísica é uma palavra grega que significa "o que está para além da física". É uma doutrina que busca o conhecimento da essência das coisas.
Se destina a buscar respostas para perguntas complexas como: O que é realidade? O que é a vida? O que é natural? O que é sobrenatural? O que nos faz essencialmente humanos?
Para isso Platão cria a Alegoria da Caverna.
Alegoria da Caverna
A história narra a vida de alguns homens que nasceram e cresceram dentro de uma caverna e ficavam voltados para o fundo dela. 
Ali contemplavam uma réstia de luz que refletia sombras no fundo da parede. Esse era o seu mundo. 
Certo dia, um dos habitantes resolveu voltar-se para o lado de fora da caverna e logo ficou cego devido à claridade da luz. E, aos poucos, vislumbrou outro mundo com natureza, cores, “imagens” diferentes do que estava acostumado a “ver”.
Voltou para a caverna para narrar o fato aos seus amigos, mas eles não acreditaram nele e revoltados com a “mentira” o mataram.
O que Platão quis dizer com o mito
Com essa alegoria, Platão divide o mundo em duas realidades: a sensível, que se percebe pelos sentidos, e a inteligível (o mundo das ideias). O primeiro é o mundo da imperfeição e o segundo encontraria toda a verdade possível para o homem. Assim o ser humano deveria procurar o mundo da verdade para que consiga atingir o bem maior para sua vida. Em nossos dias, muitas são as cavernas em que nos envolvemos e pensamos ser a realidade absoluta.
Para Platão a verdade não está no sensível, mas sim no pensamento.
As sensações mudam o tempo todo, a ideia não.
Exemplo: observe as cadeiras da imagem. São todas diferentes. E como você entende que são cadeiras? A cadeira física é mutável e está no mundo sensível. Mas existe uma essencial da cadeira que é imutável e eterna. O que define uma cadeira. A cadeira “em si”.
A cadeira é real (podemos tocar), mas segundo Platão ela não passa da sombra de mente de alguém. Da ideia geral de cadeira que existe como ideia e eterna. E quando ela se materializa do mundo das ideias para o mundo material ela é a apenas uma sombra do mundo das ideias.
Então o real para Platão não é o objeto em si, mas a essência desse objeto.
Mundo sensível e mundo inteligível (mundo das ideias).
O mundo sensível é o mundo da caverna, da opinião da crença.
Somente questionando esse mundo podemos sair da caverna.
Ascendendo ao “bem” através do mundo inteligível (mundo fora da caverna).
Onde habita a essência das coisas.
Fixação de aprendizagem.
1) Crie um exemplo do uso da Dialética platônica.
2) Diferencia o senso comum da ciência.
3) Descreva o mito da caverna de Platão.
4) O que Platão quis dizer com a alegoria da caverna.
5) Dê um exemplo de mundo sensível e mundo das ideias.

terça-feira, 13 de junho de 2017

Introdução ao Pensamento de Platão


(P.73) Cap. 03: A Caverna de Platão.
“Apenas quem filosofa e ama o conhecimento pode alcançar os deuses” Platão.
(P.75) Platão.
Certo dia, por volta de 400 a.C, um jovem chamado Aristócles (Platão é apelido e quer dizer “ombros largos”) andava pelas ruas de Atenas com uma peça de teatro, escrita por ele, nas mãos – pretendia entregá-la a Dionísio. Na escadaria do teatro avistou um animado debate filosófico liderado por Sócrates. Após ouvir um pouco os argumentos do Sátiro de Atenas desistiu de ser poeta e resolveu virar filósofo.
Platão nasceu em 427 a.C, em uma família nobre abastada apoiadora da democracia. (P.76) Sua vida e ideias são fortemente marcadas por dois fatores centrais: sua convivência com Sócrates e a decadência da democracia ateniense.
(P.77) Platão nasceu e cresceu em tempos turbulentos de guerra entre várias pólis gregas e Atenas. Em 399 a.C, viu a condenação de seu mestre em um julgamento conturbado, e após sua morte resolveu fugir, vagando doze anos pelo mundo conhecido onde virou conselheiro do rei da Sicília, foi vendido como escravo, até que finalmente -por um golpe de sorte – voltou para Atenas.
(P.78) Com 40 anos fundou uma escola de filosofia em Atenas, onde gente de toda a Grécia ia estudar com o maior discípulo de Sócrates. Dizem que a escola cresceu tanto que pode ser considerada a primeira Universidade do Ocidente.
(P.79) É tarefa complicada estabelecer onde termina o pensamento socrático e onde começa a doutrina platônica. Alguns historiadores acreditam que os primeiros diálogos são os mais fiéis ao pensamento socrático, já nas obras tardias predomina a doutrina de Platão (doutrinas impossíveis de sabermos se Sócrates teria concordado).
(P.80) As doutrinas de Platão giram em torno de duas questões centrais. Uma delas é a política – qual seria a melhor forma de governar os seres humanos? A outra gira em torno da capacidade humana de conhecer o universo – como podemos alcançar uma verdade fixa e estável, se nossas habilidades em aprender o mundo são limitadas? Suas teorias políticas são facilmente refutadas, mas sua filosofia das ideias repercute até hoje.
A Teoria das Ideias.
Para Heráclito tudo muda, para Parmênides e Zenão nada muda. Platão tentou fazer uma síntese dessas teorias e o resultado é a Teoria das Ideias.
O mundo que os sentidos nos revelam é essencialmente instável, admite Platão. As coisas que nos cercam são como o rio de Heráclito: se tentarmos afirma algo sobre o mundo, o objeto que inspirou a afirmação se transformou antes mesmo que completemos o raciocínio. Nesse universo em permanente transformação é impossível erigir um conhecimento seguro, ou episteme[1]. Logo, o mundo que vemos, sentimos, ouvimos e tocamos não é realmente real.
Tudo o que os nossos sentidos registram são aparências e sobre ela não podemos construir conhecimentos verdadeiros, mas apenas opiniões (doxa[2]).
Tudo o que compõe o universo – montanhas, animais, nosso corpo, amor – são meras cópias das Formas ou Ideias. Criadas por uma divindade misteriosa, elas são a verdadeira realidade e não mudam jamais.
(P.81) As formas não podem ser captadas pelos sentidos, apenas pelo intelecto – assim, o universo está dividido entre o mundo sensível e o mundo inteligível (das ideias).
Apesar de Platão ser duramente criticado por diversos filósofos posteriores, a questão dos universais[3] continua via até hoje. Esse tópico nasce de um fato elementar na existência humana: não podemos nos comunicar em uma linguagem formada apenas por nomes próprios. Seria impossível haver substantivo designando cada árvore, cada gato, cada cegonha, pedra, etc...
Isso levanta uma questão, essas palavras de significado geral (ser humano, gato, leitão) referem-se a algo que realmente existe, ou são meros ruídos? Caso não passem de barulhos, como é possível que nossa mente as compreenda? Se o significado das palavras tem alguma relação com o mundo real, então devemos admitir ao menos a possibilidade de que existam “entes universais” – ou seja, uma cegonhice definida por sílabas de “cegonha”, uma equinidade que dê sentido ao conjunto de fonemas que forma o termo “cavalo”. Platão argumenta que esses entes universais não são apenas convenções mentais – existem de fato, além das coisas particulares.
(P.82) Outra forma de compreender a teoria platônica, sem reduzi-la a uma espécie de alucinação, é recorrendo às verdades da matemática. Pode-se dizer que números existem; mas não da mesma forma que uma pessoa ou um objeto. Ex: minha mesa tem quatro lados e mesmo que ela deixe de existir o número quatro sempre existirá. Os números existem eternamente, tem valor universal e jamais mudam. Há uma essência do número quatro que permanecerá sempre a mesma.

(P.83) Mas de que maneira o intelecto apreende as ideias, se elas estão além do mundo? Platão acreditava na imortalidade da alma e dizia que antes delas serem inseridas nos corpos, nossos espíritos estiveram no mundo real, onde contemplaram as ideias. Ao nascermos esquecemos de tudo, mas vamos recordando conforme desenvolvemos nosso intelecto.
A ascensão do sensível ao inteligível é ilustrada em outra passagem grandiosa encontrada no livro VIII da República é o Mito da Caverna.
(P.86) A Utopia Platônica.
A palavra Utopia foi inventada no século XVI por Thomas Morus, mas o sentido que damos hoje – de uma sociedade perfeita, constituída desde o alicerce a partir de um punhado de ideias – já estava presente na República de Platão.
Nessa obra, Platão argumenta que o Estado Ideal é aquele governado pelos filósofos.
(P.87) Nesta sociedade as crianças inteligentes deveriam ser separadas da sociedade e educadas na filosofia. Ao crescerem esses escolhidos -chamados de guardiões – deterão o poder político. Entre eles haverá plena igualdade sexual.
Além dos guardiões existirão outras duas classes sociais: os soldados e os trabalhadores, que deverão seguir cegamente seu governo.
(P.88) A educação dos guardiões deveria ser baseada na matemática e no atletismo. Poesia e ficção seriam banidos, pois elas afastam a mente humana da verdade. Dentro do pensamento platônico essa proibição é justificável. O mundo sensível não é o mundo real, e uma obra de arte – por mais perfeita – multiplica os graus de separação do mundo das ideias.
(P.89) O fato é que com os olhos postos no bem supremo da humanidade, os debatedores da República criaram um paraíso perfeitamente insuportável.
(P.90) O Platonismo real.
Platão foi convidado a pôr em prática sua República em Siracusa e não deu certo.
(P.91) A Autocrítica de Platão.
A teoria de Platão baseia-se na bifurcação do mundo entre inteligível e sensível, afirmando que o primeiro era mais real que o segundo. E que no mundo inteligível existem múltiplas formas que são refletidas no mundo dos sentidos.
Parmênides ao ouvir a teoria de Sócrates (lembrando que Platão atribuía a ele suas teorias) disse que se tudo tem uma forma ideal, as coisas ruins também deveriam ter uma forma ideal, maldade ideal, ódio ideal, esterco ideal, etc.
Fonte.
BOTELHO, José Francisco. Uma Breve História da Filosofia: São Paulo. Abril. 2015. P.73-98


[1] Episteme: na filosofia grega, esp. no platonismo, o conhecimento verdadeiro, de natureza científica, em oposição à opinião infundada ou irrefletida.
[2] Doxa: sistema ou conjunto de juízos que uma sociedade elabora em um determinado momento histórico supondo tratar-se de uma verdade óbvia ou evidência natural, mas que para a filosofia não passa de crença ingênua, a ser superada para a obtenção do verdadeiro conhecimento.
[3] Questão dos universais: Esta questão divide os filósofos em realistas, como Platão, em que as espécies, como a espécie humana, são em certo sentido coisas, e em nominalistas, em que “espécie” não passa de uma palavra. O universal é um conceito filosófico que diz que existe algo que é partilhado por objectos particulares diferentes.