(P.73) Cap. 03: A Caverna de Platão.
“Apenas
quem filosofa e ama o conhecimento pode alcançar os deuses” Platão.
(P.75) Platão.
Certo
dia, por volta de 400 a.C, um jovem chamado Aristócles (Platão é apelido e quer
dizer “ombros largos”) andava pelas ruas de Atenas com uma peça de teatro,
escrita por ele, nas mãos – pretendia entregá-la a Dionísio. Na escadaria do
teatro avistou um animado debate filosófico liderado por Sócrates. Após ouvir
um pouco os argumentos do Sátiro de Atenas desistiu de ser poeta e resolveu
virar filósofo.
Platão
nasceu em 427 a.C, em uma família nobre abastada apoiadora da democracia. (P.76) Sua vida e ideias são fortemente
marcadas por dois fatores centrais: sua convivência com Sócrates e a decadência
da democracia ateniense.
(P.77) Platão nasceu e cresceu em tempos
turbulentos de guerra entre várias pólis gregas e Atenas. Em 399 a.C, viu a
condenação de seu mestre em um julgamento conturbado, e após sua morte resolveu
fugir, vagando doze anos pelo mundo conhecido onde virou conselheiro do rei da
Sicília, foi vendido como escravo, até que finalmente -por um golpe de sorte –
voltou para Atenas.
(P.78) Com 40 anos fundou uma escola de
filosofia em Atenas, onde gente de toda a Grécia ia estudar com o maior
discípulo de Sócrates. Dizem que a escola cresceu tanto que pode ser
considerada a primeira Universidade do Ocidente.
(P.79) É tarefa complicada estabelecer
onde termina o pensamento socrático e onde começa a doutrina platônica. Alguns
historiadores acreditam que os primeiros diálogos são os mais fiéis ao
pensamento socrático, já nas obras tardias predomina a doutrina de Platão
(doutrinas impossíveis de sabermos se Sócrates teria concordado).
(P.80) As doutrinas de Platão giram em
torno de duas questões centrais. Uma delas é a política – qual seria a melhor
forma de governar os seres humanos? A outra gira em torno da capacidade humana
de conhecer o universo – como podemos alcançar uma verdade fixa e estável, se
nossas habilidades em aprender o mundo são limitadas? Suas teorias políticas
são facilmente refutadas, mas sua filosofia das ideias repercute até hoje.
A Teoria das Ideias.
Para
Heráclito tudo muda, para Parmênides e Zenão nada muda. Platão tentou fazer uma
síntese dessas teorias e o resultado é a Teoria das Ideias.
O
mundo que os sentidos nos revelam é essencialmente instável, admite Platão. As
coisas que nos cercam são como o rio de Heráclito: se tentarmos afirma algo
sobre o mundo, o objeto que inspirou a afirmação se transformou antes mesmo que
completemos o raciocínio. Nesse universo em permanente transformação é
impossível erigir um conhecimento seguro, ou episteme[1]. Logo, o mundo que vemos,
sentimos, ouvimos e tocamos não é realmente
real.
Tudo
o que os nossos sentidos registram são aparências e sobre ela não podemos
construir conhecimentos verdadeiros, mas apenas opiniões (doxa[2]).
Tudo
o que compõe o universo – montanhas, animais, nosso corpo, amor – são meras
cópias das Formas ou Ideias. Criadas por uma divindade misteriosa, elas são a
verdadeira realidade e não mudam jamais.
(P.81) As formas não podem ser captadas
pelos sentidos, apenas pelo intelecto – assim, o universo está dividido entre o
mundo sensível e o mundo inteligível (das ideias).
Apesar
de Platão ser duramente criticado por diversos filósofos posteriores, a questão dos universais[3] continua via até hoje.
Esse tópico nasce de um fato elementar na existência humana: não podemos nos
comunicar em uma linguagem formada apenas por nomes próprios. Seria impossível
haver substantivo designando cada árvore, cada gato, cada cegonha, pedra,
etc...
Isso
levanta uma questão, essas palavras de significado geral (ser humano, gato,
leitão) referem-se a algo que realmente existe, ou são meros ruídos? Caso não
passem de barulhos, como é possível que nossa mente as compreenda? Se o
significado das palavras tem alguma relação com o mundo real, então devemos
admitir ao menos a possibilidade de que existam “entes universais” – ou seja,
uma cegonhice definida por sílabas de “cegonha”, uma equinidade que dê sentido
ao conjunto de fonemas que forma o termo “cavalo”. Platão argumenta que esses
entes universais não são apenas convenções mentais – existem de fato, além das
coisas particulares.
(P.82) Outra forma de compreender a teoria
platônica, sem reduzi-la a uma espécie de alucinação, é recorrendo às verdades
da matemática. Pode-se dizer que números existem; mas não da mesma forma que uma pessoa ou um objeto. Ex: minha mesa tem
quatro lados e mesmo que ela deixe de existir o número quatro sempre existirá.
Os números existem eternamente, tem valor universal e jamais mudam. Há uma
essência do número quatro que permanecerá sempre a mesma.
(P.83) Mas de que maneira o intelecto
apreende as ideias, se elas estão além do mundo? Platão acreditava na
imortalidade da alma e dizia que antes delas serem inseridas nos corpos, nossos
espíritos estiveram no mundo real, onde contemplaram as ideias. Ao nascermos
esquecemos de tudo, mas vamos recordando conforme desenvolvemos nosso
intelecto.
A
ascensão do sensível ao inteligível é ilustrada em outra passagem grandiosa
encontrada no livro VIII da República é o Mito
da Caverna.
(P.86) A Utopia Platônica.
A
palavra Utopia foi inventada no século XVI por Thomas Morus, mas o sentido que
damos hoje – de uma sociedade perfeita, constituída desde o alicerce a partir
de um punhado de ideias – já estava presente na República de Platão.
Nessa
obra, Platão argumenta que o Estado Ideal é aquele governado pelos filósofos.
(P.87) Nesta sociedade as crianças
inteligentes deveriam ser separadas da sociedade e educadas na filosofia. Ao
crescerem esses escolhidos -chamados de guardiões – deterão o poder político.
Entre eles haverá plena igualdade sexual.
Além
dos guardiões existirão outras duas classes sociais: os soldados e os
trabalhadores, que deverão seguir cegamente seu governo.
(P.88) A educação dos guardiões deveria
ser baseada na matemática e no atletismo. Poesia e ficção seriam banidos, pois
elas afastam a mente humana da verdade. Dentro do pensamento platônico essa
proibição é justificável. O mundo sensível não é o mundo real, e uma obra de
arte – por mais perfeita – multiplica os graus de separação do mundo das
ideias.
(P.89) O fato é que com os olhos postos no
bem supremo da humanidade, os debatedores da República criaram um paraíso
perfeitamente insuportável.
(P.90) O Platonismo real.
Platão
foi convidado a pôr em prática sua República em Siracusa e não deu certo.
(P.91) A Autocrítica de Platão.
A
teoria de Platão baseia-se na bifurcação do mundo entre inteligível e sensível,
afirmando que o primeiro era mais real que o segundo. E que no mundo
inteligível existem múltiplas formas que são refletidas no mundo dos sentidos.
Parmênides
ao ouvir a teoria de Sócrates (lembrando que Platão atribuía a ele suas
teorias) disse que se tudo tem uma forma ideal, as coisas ruins também deveriam
ter uma forma ideal, maldade ideal, ódio ideal, esterco ideal, etc.
Fonte.
BOTELHO, José Francisco. Uma Breve História da Filosofia: São
Paulo. Abril. 2015. P.73-98
[1] Episteme: na filosofia grega, esp. no
platonismo, o conhecimento verdadeiro, de natureza científica, em oposição à
opinião infundada ou irrefletida.
[2] Doxa: sistema ou conjunto de juízos que
uma sociedade elabora em um determinado momento histórico supondo tratar-se de
uma verdade óbvia ou evidência natural, mas que para a filosofia não passa de
crença ingênua, a ser superada para a obtenção do verdadeiro conhecimento.
[3] Questão dos universais: Esta questão
divide os filósofos em realistas, como Platão, em que as espécies, como a
espécie humana, são em certo sentido coisas, e em nominalistas, em que
“espécie” não passa de uma palavra. O universal é um conceito filosófico que
diz que existe algo que é partilhado por objectos particulares diferentes.
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