Lilia Katri Moritz
Schwarcz
Lilia Katri Moritz
Schwarcz graduada em História pela Universidade de São Paulo (1980), tornou-se
mestre em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas (1986),
doutora em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo (1993), e livre-docente
em Antropologia Social pela USP (1998). Atualmente é professora titular da
Universidade de São Paulo (2005), editora da Companhia das Letras (onde
coordena coleções de não ficção), membro do advisory group - Harvard
University, membro do Conselho Científico do Instituto de Estudos Avançados da
UFMG, sócia do IHGB, membro da conselho da Revista da USP, da Revista de
História da Biblioteca Nacional, da Revista Brasileira de Ciências Sociais, da
Revista Etnográfica (Lisboa) e da revista Penélope (Lisboa), coordenadora do
GT/ Anpocs de Pensamento Social. Foi professora visitante e pesquisadora nas
universidades de Leiden, Oxford, Brown e Columbia (Tinker Professor). Foi
curadora de uma série de exposições que aliam história, artes e antropologia.
Tem experiência na área de Antropologia e História, com ênfase em Antropologia
das Populações Afro-Brasileiras, Marcadores de Diferênça e História do Império
brasileiro, atuando principalmente nos seguintes temas: Brasil monárquico,
escravidão, construções simbólicas, história da antropologia , etnicidade,
construções imagéticas e identidade social. (...)
QUESTÕES DE
FRONTEIRA.
Neste artigo
intitulado Questões de Fronteira, publicado originalmente na revista Novos
Estudos organizada pelo CEBRAP (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), a
autora Lilia Katri Moritz Schwarcz tenta traçar um parâmetro, uma fronteira
entre a História e a Antropologia. Em até que ponto uma influi na outra e
vice-versa. Ela faz essas análises a partir do diálogo com as obras de Lévi-Strauss,
Marchall Sahlins e Thomas Mann, entre outros. E por fim analisa a questão da
noção do tempo em outras culturas além da ocidental.
História
Antropológica ou Antropologia da História?
Nesta primeira parte
do texto a autora se propõe a investigar momentos em que a antropologia
refletiu na história. E como antropólogos e historiadores reagiram a isso.
Sempre levando em conta o fato de que para a etnografia, não se pode entender a
história no singular.
Lilia Schwarcz faz
uma pergunta: “É possível definir história como um conceito universal. Já que a
experiência comum da passagem do tempo é consensual, mas também particular?” e
completa “a história pode ser tomada com uma disciplina, ou como uma categoria
fundamental?”
Ou seja, todas as
sociedades têm sua própria maneira de marcar a passagem do tempo, o que não
quer dizer algumas estão erradas e outras certas, apenas que são diferentes.
Além do mais, preenchem todas as necessidades daquela sociedade.
Para tal, a autora
busca compreender como a antropologia entende e registra a história em todas as
sociedades inclusive a ocidental. Aí encontra-se o grande dilema, onde acaba a
história e começa a antropologia, que papel a história assumiu na constituição
da antropologia, onde encontra-se essa fronteira?
História como
conjuntura ou ausência de história.
Ao surgir, a
antropologia estava imbuída do pensamento Darwinista e alguns antropólogos do
século XIX acreditavam que existiam alguns povos que não aviam evoluído e ainda
estava no chamado estado primitivo. Esses antropólogos acreditavam que a Europa
representava o auge da evolução, pois ele evoluíra cumulativamente rumo ao
progresso e que esses povos ainda estariam na infância. Então, se esses povos
não tinham história, no sentido ocidental da palavra (Cronológica, documentada,
etc.), não havia o que se estudar.
Foi nesse momento que
antropólogos, culturalistas norte-americanos e funcionalistas ingleses,
decidiram distanciaram-se da história, da diacronia[i] e
do evolucionismo.
Franz Boas
(1858-1942) propôs que se procurassem desenvolvimentos particulares em cada
sociedade. Não que se trouxesse a história de um povo isolado para a história
ocidental, o que seria praticamente impossível uma vez que a maioria desses
povos não dominavam a escrita, mas que se procurasse nesses povos o porquê de
seu desenvolvimento ter ocorrido de forma diferente da ocidental e de tantas
outras. Sem transformar a história “deles” em nossa história.
Outras histórias,
tantas histórias
Para Evans-Pritchard
o debate acirrado entre história e antropologia era necessário e indispensável,
uma vez que as duas disciplinas se complementam. Ele acreditava, que apesar da
antropologia estudar o presente, era de extrema importância que em todo projeto
antropológico se fizesse um resgate histórico, pois, para ele não existia
sociedade sem história.
Lévi-Strauss chegou a
conclusão em seu livro Raça e História que todas as sociedades
têm história, mesmo os povos chamados anteriormente de “povos crianças”, a
única diferença e como cada uma dessas sociedades espalhadas pelo planeta se
relacionam com a história. Cada povo se relaciona com o conhecimento histórico
a sua maneira. Alguns povos têm um modelo fixo, progressivo e acumulativo de se
relacionar com a história, outras se utilizam de um modelo cíclico, sempre aberto
a mudanças e que muitas vezes apagam seus vestígios. Para Claude Lefort a
etnologia deveria trabalhar com essas questões, segundo suas próprias palavras
“Por que, uma mesma humanidade, às voltas com as mesmas questões, dá a elas
soluções diferentes?”
Lévi-Strauss
acreditava que a grande diferença entre história e antropologia nos
procedimentos, o historiador estuda muitos documentos e o antropólogo apenas
um. E nas consciências dos povos frente a história, o historiador estuda os
conscientes e a antropologia os inconscientes.
Uma antropologia das
historicidades e seus vários caminhos.
Em 1970,
influenciados por interpretações enganosas de Lévi-Strauss, os antropólogos se
dividiram entra aqueles que se opunham a estrutura e sua condenação da história
e aqueles que utilizavam da estrutura.
Marshall Sahlins se
considerava um “estruturalista histórico” e fazia uso da antropologia histórica
e considerava que a grande dificuldade dela era saber como os eventos são
ordenados pela cultura. Além de acreditar que do contato entre duas culturas,
ambas sairiam alteradas. Clifford Geertz em sua passagem pela Indonésia elabora
críticas a filosofia ocidental e defende que a história de uma civilização pode
ser descrita de duas maneiras: ou pela progressão dos grandes acontecimentos ou
pelo desenvolvimento sociocultural. Os dois autores acreditam que o presente é
determinado pelo passado, mas a resposta de cada sociedade a esse passado se
aconteceu e acontece de forma diferente.
Temporalidade em
nossa história ocidental.
Lévi-Strauss é claro
quando diz que “em nossas sociedades a história substituiu a mitologia e
desempenha a mesma função. E se para as sociedades sem escrita essa mitologia
assegura que o passado foi igual ao presente e que o futuro se manterá fiel a esse
passado, para o ocidente a história garante que o futuro será muito diferente
do presente.
A grande questão aí,
é o fato de que, se as outras culturas carregam “história no plural” o ocidente
também, não sendo apenas um conjunto de sociedades que tem como ordem do dia a
cronologia.
O tempo da montanha.
Por fim, o grande
desafio do ocidente é encontrar as várias histórias que ocorrem dentro dele. E
a antropologia em conjunto com a história é de fundamental importância para
essa análise rumo ao interior de minha própria sociedade.
Sites consultados:
Bibliografia:
SCHWARCZ; Lilia K.M:
“Questões de Fronteira” Revistas novos estudos. Nº72, julho de 2005.
[i] Diacronia: Caráter dos fenômenos Lingüísticos observados quanto a
sua evolução no tempo.