VOZES
DO MAR.
Resumo
Flávio Luís Rodrigues em seu livro tenta entender
como a historiografia Brasileira trata o movimento que ocorrera nos dia 25, 26
e 27 de março de 1964 onde mais de mil marinheiros se amotinaram no Sindicato
dos Metalúrgicos do Estado da Guanabara. Para tal fim, o autor faz um apanhado
geral partindo de um contexto internacional, passando pelo nacional desde
Getúlio Vargas até João Goulart, para assim entender as influências que
incidiram sobre a criação da AMFNB (Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais
do Brasil), sua revolta e extinção. Por fim Flávio Luís chega ao ponto central
de seu livro; como a historiografia brasileira, e suas diversas interpretações,
tratam desse assunto tão polêmico.
Boa Leitura.
A
AMFNB.
Na década de 60 era muito difícil a ascensão de um
marinheiro a oficial, pois, os cargos do oficialato eram reservados aqueles que
faziam cursos diferentes dos reservados aos marinheiros. Por esse motivo não
era raro ver filho de almirante seguir a mesma carreira do pai como se fosse
algo hereditário.
A Grande maioria dos marujos tinha origem no norte
ou nordeste do país, em sua maior parte camponeses de áreas pobres e com poucos
empregos para os jovens. Com pouca ou nenhuma escolaridade os jovens eram
atraídos pelas belas propagandas da Marinha. A família desses rapazes muitas
vezes não aprovavam essa decisão, graças ao preconceito que existia para com os
marinheiros, que eram taxados de cara da zona, cara bagunceiro, valentão,
briguento, alcoólatra, etc.
Com o tempo dentro da marinha esses rapazes “caiam
na real”, já que a vida dentro dos navios era muito difícil para o marujo de
baixa patente. A oposição entre oficiais e marinheiros adquiriu proporções de
oposição de classe, uma vez, que os cargos do oficialato estavam reservados aos
integrantes das classes mais abastadas.
A Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do
Brasil foi criada no dia 25 de março de 1962, tendo como primeiro presidente
João Barbosa de Almeida. Essa associação surgiu no âmbito de diversas mudanças
políticas, sociais que ocorriam no Brasil e no mundo, como o autor faz questão
de relatar: A crise dos mísseis, a renúncia de Jânio Quadros e o governo João
Goulart com a crise do populismo, etc.
Essa primeira diretoria nunca foi reconhecida
legalmente pela marinha, contudo era tolerada pelo fato de sua submissão e boa
relação com o almirantado. A presidência de João Barbosa foi marcada por sua
política conciliatória e assistencialista. Com o tempo surgiram duas facções
dentro da associação, uma de tom mais conservador e outra mais radical que
pregava autonomia para com a alta cúpula da marinha.
A segunda diretoria, eleita no ano seguinte, tinha
um tom mais radical que a antecessora. Sob a presidência de José Anselmo dos
Santos defendia-se a autonomia da instituição, relacionava-se com vários
sindicatos e entidades como a UNE, além de ser simpático as reformas de Jango.
De março de 1962 até agosto de 1963 a AMFNB foi
tolerada pela marinha, mas a Revolta dos Sargentos de Brasília em setembro
daquele ano quando cerca de 600 praças amotinados trocaram tiros com a tropa do
exército, levou as forças armadas a temer a crescente politização dos militares
de baixa patente, com isso a administração declarou ilegal o estatuto da
associação.
O ano de 1964 começou com um conflito declarado
entre o ministério da Marinha e a AMFNB, onde integrantes e líderes da
associação sofriam todo tipo de pressão e perseguição por parte de seus
superiores. A radicalização de ambos, próximo ao aniversário de dois anos da
instituição, levou a revolta dos marinheiros.
Durante a festa que, diga-se de passagem, foi
proibida pelo alto escalão da marinha, os marinheiros que festejavam dentro do
Sindicato dos Metalúrgicos do Estado da Guanabara ficaram sabendo da prisão do
1ª classe Otacílio dos Anjos Santos. Surgindo a proposta de manter vigília até
sua liberdade, que mais tarde foi acrescida de mais uma reivindicação: O
reconhecimento da Associação dos Marinheiros e fuzileiros Navais do Brasil pela
marinha.
Para conter a rebelião foram enviados tropas do exército,
que invés de se posicionarem contra o movimento começaram a aderir a ele,
entrando desarmados para dentro do sindicato.
No dia 27 de março uma foto estampou a capa do
jornal Última Hora onde José Anselmo dos Santos aparece lado a lado com João
Candido líder da Revolta da Chibata. Com isso o movimento de 1964 procurava
legitimação no de 1910, já que muitas das reivindicações já vinham daquela
época como: Casamento, vestir paisana fora do serviço, melhoria do salário etc.
Diante de tal crise o ministro da marinha Sylvio
Motta exonerou-se do cargo, o que gerou uma espécie de pequena vitória dos
marinheiros. Para substituí-lo foi convidado o Almirante Paulo Mário da Cunha
Rodrigues que anistiou todos os rebelados do sindicato dos metalúrgicos. Isso
irritou ainda mais os almirantes.
Após a anistia os marinheiros comemoraram em
passeata pelas ruas centrais do Rio. Todos esses atos de indisciplina das
tropas e tolerância por parte do governo podem ter sido o estopim que os
militares, que já conspiravam contra o governo de Goulart, tanto precisavam
para justificar sua ação no dia dois de Abril de 1964.
JOSÉ
ANSELMO DOS SANTOS:
A figura mais polêmica do movimento modificou toda a
forma como a historiografia entendeu o motim dos marinheiros, menos de uma
semana antes do golpe militar.
O segundo presidente da AMFN foi eleito com 236
votos, contra 46 de José Fernandes, 8 de Antônio Carlos e 7 nulos. Ou seja, o
representante da ala mais radical da associação ganhou com larga margem para
seus adversários, o que parecia demonstrar que contava com grande apoio entre
os marinheiros.
Estudiosos de esquerda associam a revolta a um plano
previamente articulado pela CIA e realizado por José Anselmo, para desestabilizar
o governo da Jango.
Toda essa desconfiança parte do que ele se tornara
na década de 70, onde aderiu ao sistema de repressão do delegado do DOPS,
Sérgio Paranhos Fleury, provocando com suas delações o desaparecimento de mais
de 200 militantes de organizações de esquerda.
Com isso, segundo o autor, a historiografia
brasileira condenou todo o passado da AMFNB com base no que José Anselmo viria
se tornar no futuro. Não há evidências de que Anselmo já era um agente duplo
infiltrado na AMFNB. Ele acredita que a adesão do mesmo só ocorreu em 1971,
quando ele e Edgard Aquino Duarte foram presos, Anselmo foi solto e Edgard
desapareceu.
AS
VERSÕES DA HISTORIOGRAFIA:
Segundo o autor Flávio Luis Rodrigues, existem três
correntes que pensam esse acontecimento, de formas distintas:
A primeira, em geral veiculada por militares,
acredita que aquela revolta foi incitada por interesses comunistas, que vendo a
fraqueza do governo diante de tal motim poderiam a qualquer momentos iniciar
uma revolução socialista no Brasil. Muitos vinculam o medo de que acontecesse
aqui o que ocorreu na Rússia em 1905 com o Encouraçado Potemkim.
A segunda é defendida por historiadores e
jornalistas de esquerda e associa a revolta à trajetória pouco exemplar de
Anselmo. Essa versão acredita na infiltração da agitadores da CIA ao movimento,
para assim criar o estopim do golpe já pré-planejado.
A terceira corrente, ao qual o autor compartilha,
trata da revolta de forma cuidadosa, não vinculando a AMFNB à trajetória de
Anselmo.
Flávio Luis não nega o fato de que a revolta tenha
sim, influenciado a queda de Jango. Mas defende a veracidade do movimento dos
marinheiros, onde segundo o autor, como poderiam ter ido a favor do golpe se a
maioria absoluta dentro da AMFNB era simpatizante das reformas de base do
presidente deposto.
Para o autor o movimento dos marinheiros não foi
incitado nem por comunistas, nem pelos agentes da CIA. O intuito dos marujos
nunca foi criar justificativas para a derrubada o presidente, na verdade foi um
movimento autônomo que lutava por mais direitos e melhores condições de vida
dentro da marinha.
Ou seja, os marinheiros se revoltaram contra seus
superiores imediatos, talvez seja certo afirmar que a associação foi usada para
abalar o governo Jango, mas não por seu segundo presidente e sim pelo
oficialato golpista que manobrou para encurralar politicamente a marujada e
provocar a reação.
Bibliografia:
Existem vários relatos sobre o clima da Rebelião dos Marinheiros... e, sim, vários (incluindo Marighella, que parece também ter contribuído para a redação do manifesto lido por Anselmo) consideravam que "o destino do Brasil está sendo decidido". Aliás, o clima de golpe à esquerda ou contragolpe da direita estava mais do que presente... e a retórica da esquerda era revolucionária: os exemplos são inúmeros.
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