O primeiro capítulo de Social Anthropology and Other Essays. E.
E. Evans¬Pritchard. Free Press. New York. 1966.
Natural de Sussex, Inglaterra, E.E. Evans-Pritchard nasceu
no dia 21 de setembro de 1902, iniciou seus estudos em Oxford e obteve seu
doutorado na London School of Economics and Political Sciences (LSE). Seu
primeiro trabalho de campo foi justamente entre os Azande, povo localizado no
centro norte da África, com quem conviveu em diferentes períodos entre 1926 e
1932. Os resultados dessa pesquisa foram, sua tese de doutorado e a publicação
e a publicação de Bruxaria, Oráculos, e Magia entre os Azande, além de inúmeras
obras publicadas ao longo de sua carreira. Entre 1935 e 1938 dedicou-se
novamente a estudar os povos africanos, desta vez realizando a pesquisa de
campo entre os Nuer. Desta nova experiência surgiram diversas obras, com
destaque para Os Nuer: uma descrição do modo de subsistência e das instituições
políticas de um povo nilota. Feito cavaleiro em 1971, Evans-Pritchard faleceu
na cidade de Oxfordshire na Inglaterra em 11 de setembro de 1973, então com 70
anos. (...)
E.E Evans-Pritchard foi sem dúvida um dos grandes
responsáveis pela difusão e desenvolvimento da chamada antropologia social
britânica. Suas contribuições são ainda hoje de fundamental importância nas
discussões acerca da etnografia e da teoria antropológica.
A obra.
Em sua obra A noção de Bruxaria como explicação de
infortúnios, E. E Evans-Pritchard discorre sobre a forma singular como a tribo
Zande reage frente à bruxaria. Diferentemente de um ocidental que a vê como
algo terrível, espetacular, mágico etc. os azandes tem o conceito de que a
bruxaria é algo rotineiro, onipresente e que regula todas as funções de sua
vida. Sendo algo tão comum que o sistema de valores sociais dessa tribo é
inteiramente regulado pensando na possibilidade (e certeza) de que a bruxaria
irá ocorrer em algum momento do dia ou da noite.
A maioria dos infortúnios que um azande sofrer durante a
vida, podem (e serão) atribuído a atos de bruxaria. A atuação de forças
sobrenaturais, nada tem de milagroso, quando um azande sai para caçar, por
exemplo, já tem total conhecimento da possibilidade de ser prejudicado por
bruxos. Quando a bruxaria se realiza, ou nesse caso o caçador não consegue a
caça, ao invés de sentir-se apavorado frente às “forças sobrenaturais” que
rondaram a sua caçada, o azande fica, nas palavras de Evans-Pritchard, é
extremamente aborrecido. Pois sabe que a bruxaria é sempre realizada por alguém
próximo que deseja seu mal.
Engana-se quem pensa que os azande descartam as causas
naturais dos acontecimentos, eles têm total consciência de que os infortúnios
foram causados por elementos físicos como, fogo, animais, tocos de árvores,
cupins, lanças inimigas etc. e não por presenças mágicas. Entretanto, como
explicar o vácuo, que no ocidente é preenchido com a chamada coincidência.
Simples, para os azande esse vazio é preenchido com a bruxaria.
Evans-Pritchard usa como exemplo, um jovem azande que
enquanto caminhava pela savana bateu com o pé em um toco de árvore, onde o
ferimento resultante desse acidente infeccionou. O jovem atribuiu seu acidente
a bruxaria, não que a bruxaria tenha colocado aquele toco de árvore em seu
caminho para que ele se machucasse, mas “o que ele atribuiu a bruxaria, foi
que, nesta ocasião particular, quando agiu com sua cautela costumeira, bateu
com o pé num toco de árvore, enquanto que, em cem outras ocasiões não a fez...”
. Ou seja, aquela frase: lugar errado na hora errada, entre os azande pode ser
entendida como efeito de bruxaria.
Essa tribo acredita que a bruxaria não causa a morte de
forma sobrenatural, segundo os azandes ela funciona como a segunda lança. O
animal que mata um caçador é a primeira lança enquanto a bruxaria funcionária
como a segunda lança, dando o golpe de misericórdia no infeliz enfeitiçado.
Mas, a bruxaria não pode ser usada como desculpa por um
Zande inescrupuloso, que utilizando-se da desculpa de estar enfeitiçado, cometa
crimes dentro da tribo. A doutrina azande é clara nesse aspecto quando diz que
a bruxaria não faz ninguém mentir. Se um homem assassina outro dentro da tribo,
não há necessidade de procurar um culpado bruxo, pois, ao homicida já é
direcionado a vingança.
O uso da bruxaria só pode ser aplicado como explicação dos
infortúnios, caso a pessoa já seja experiente no desempenho da função que,
acredita, tenha sido prejudicada. Casos de preguiça, incompetência e ignorância
profissional não são bruxaria, mas somente despreparo. Como exemplo o autor
utiliza-se de um artesão, que experiente na arte de seus antepassados, produz
vasos com o mais meticuloso cuidado, caso os vasos venham a rachar no forno ele
pode atribuir esse fato a bruxaria, uma vez que usou de todas as técnicas
possíveis existentes para sua fabricação. Entretanto, um jovem artesão que está
aprendendo o ofício não pode responsabilizar a bruxaria caso isso venha a
acontecer, mas somente responsabilizar a si mesmo e sua inexperiência. Isso
ocorre em todas as instancias da vida azande.
Comparações.
Essa ideia de que a inveja pode ser causadora de diversos
males é presente em várias culturas mundo afora. Temos o chamado “olho gordo”,
“mau olhado”, “agouro”, “energias negativas” etc. Não é difícil encontrar pelo
interior do Brasil diversas, carrancas, crânios de bois, amuletos que visam
barrar essas más energias que, acreditam, são causadoras de diversos
infortúnios.
Sendo essa crença não apenas uma relíquia de tempos
imemoriais, ou de povos isolados. Basta uma rápida pesquisa na internet que
vemos surgir diversos sites com rezas, simpatias, amuletos, benzeduras, contra
esse mau que é o olho gordo.
A noção do olho gordo assemelha-se em muitos aspectos a
noção de bruxaria dos azande. Tem como ponto partida a inveja de pessoas
próximas, que traz com isso diversos malefícios ao tal enfeitiçado.
Por fim, o texto de Evans-Pritchard é um clássico da
Antropologia, e como tal deve ser lido sempre no contexto em que foi produzido.
Contexto esse profundamente marcado pelo rompimento com as concepções sobre a
“cientificidade da disciplina” e a “racionalidade dos nativos”.
Sites pesquisados
http://www.sociologia.com.br/res/res27_1.htm
http://etnografianovirtual.wordpress.com/category/evans-pritchard/
Bibliografia.
EVANS-PRITCHARD, E. E. “A noção
de bruxaria como explicação de infortúnios”. Cadernos de Antropologia.
Brasília: UnB, 1973.
Muito boa essa análise sobre esta grande obra antropológica de Evans Prichard. Me ajudou muito!
ResponderExcluirAbraços.
Também gostei da análise. Como consigo essa bibliografia utilizada (Cadernos de Antropologia)?
ResponderExcluirSe não me engano esses cadernos antropológicos são produzidos pela UNB! Vou procurar e te mando um e-mail
ResponderExcluirÓtimo! Mim ajudou bastante .
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