(P.159) Cap. VI: O trabalho dos sonhos.
Todas
as tentativas até hoje feitas de solucionar o problema dos sonhos tem lidado
diretamente com seu conteúdo manifesto, tal como se apresenta em nossa memória.
Freud é o primeiro a levar algo mais em consideração.
(P.160) Freud introduz
uma nova classe de material psíquico entro o conteúdo manifesto dos sonhos e as
conclusões de sua investigação: a saber, se conteúdo latente, ou também chamado
de “pensamentos do sonho”, obtido por meio de seu método.
É
desses pensamentos dos sonhos, e não do conteúdo manifesto, que depreendemos
seu sentido.
(A) O Trabalho de condensação.
A
primeira coisa que se torna clara para quem quer que compare o conteúdo do
sonho com os pensamentos oníricos é que ali se efetuou um trabalho de
condensação em larga escala. Os sonhos são curtos, insuficientes e lacônicos em
comparação com a gama e a riqueza dos pensamentos oníricos.
Se
o sonho for escrito, talvez ocupe meia página. A análise dele pode ocupar sete,
outo, dez vezes mais.
(P.161) E por mais bem
interpretado que seja o sonho, nunca estará completo, pois é impossível
determinar o volume de sua condensação.
(P.176) (B) O Trabalho de deslocamento.
Ao
apresentar diversos exemplos de condensação nos sonhos, a existência de outra
relação se mostrou evidente. Viu-se que os elementos que se destacam como os
principais componentes do conteúdo manifesto do sonho estão longe de
desempenhar o mesmo papel nos pensamentos do sonho. Em outras palavras, o que é
claramente essencial ao pensamento do sonho não precisa, de modo algum, ser
representado no sonho.
(P.178) Parece plausível
supor que, no trabalho do sonho, está em ação uma força psíquica que, por um
lado, despoja os elementos com alto valor psíquico de sua intensidade, e por
outro, por meio da sobredeterminação, cria, a partir de elementos de baixo
valor psíquico, novos valores, que depois de penetram no conteúdo do sonho.
Assim sendo, ocorre um transferência e deslocamento de intensidades psíquicas
no processo de formação do sonho, e é como resultado destes que se verifica a
diferença entre o texto do conteúdo do sonho e dos pensamentos do sonho.
A
consequência do deslocamento do sonho é que o conteúdo do sonho não mais se
assemelha ao núcleo dos pensamentos do sonho, e que este não apresenta mais do
que uma distorção do desejo do sonho que existe no inconsciente. Já vimos
anteriormente o processo de distorção dos sonhos e agora sabemos que o
deslocamento do sonho é um dos principais métodos pelos quais essa distorção é
obtida.
(C) Os meios de representação nos
sonhos.
No
processo de transformar os pensamentos latentes no conteúdo manifesto de um
sonho, vimos dois fatores em ação: a condensação e o deslocamento do sonho. À
medida que prosseguimos encontraremos ainda dois outros fatores determinantes.
(P.179) Para Freud a
construção, ou a elaboração de um sonho, destrói as conjunções que ligam as
cadeias de ideias formadas no material do pensamento do sonho (conteúdo do
sonho), e a restauração dos vínculos que o trabalho do sonho destruiu, cabem ao
pro cesso interpretativo, daí a importância de se entender os meios de
representação dos sonhos, que por si só são incapazes de representar as
relações lógicas de si.
(P.181) Relações casuais ou casualidades: para
representar relações casuais, os sonhos possuem dois procedimentos que são, em
essência, os mesmos, ligados por uma ideia em comum.
Sonho introdutório e sonho principal: quando a ideia
oculta que se deseja passar está dividida, porém ligada por esses dois tipos de
sonhos, um completando e/ou afirmando a ideia oculta presente no outro.
(P.182) Muitas vezes, é
como se o mesmo material fosse representado nos dois sonhos a partir de
diferentes pontos de vista.
(P.183) Contrariedade: a maneira como
os sonhos tratam a categoria dos contrários é altamente digna de nota. Ela é
simplesmente desconsiderada. O “não” não parece existir no que diz respeito aos
sonhos. O sonho utiliza de um mesmo elemento para simbolizar ideias e sentidos
opostos e contrários.
(P.184) Relação de semelhança: conhecida como
a relação “tal como”, essa relação consiste em criar elementos paralelos onde
os que já estão presentes não conseguem penetrar de forma clara no sonho em
virtude da censura imposta pela resistência. Dentre as maneiras de
representação dessa relação estão à identificação e a composição. A
identificação é empregada quando se trata de pessoas, já a composição, embora também
se aplique a pessoas, é empregada quando as coisas são o material de
unificação.
A
semelhança é representada nos sonhos pela unificação, que pode já estar presente
no material dos pensamentos do sonho ou pode ser novamente construída. A
primeira dessas possibilidades pode ser descrita como “identificação” e a
segunda como “composição”.
Identificação: na
identificação apenas uma das pessoas ligadas por um elemento comum consegue ser
representado no conteúdo manifesto dos sonhos, enquanto a segunda pessoa ou as
demais pessoas parecem ser suprimidas dele, logo essa figura encobridora
aparece no sonho em todas as relações e situações que se aplicam quer a ela, quer
a figura que ela encobre.
Composição: quando a
composição se estende a pessoas, a imagem onírica ocorre da seguinte forma, uma
junção de trações das determinadas pessoas, cuja aglutinação forma um novo
elemento, uma nova imagem onírica irreconhecível para o sonhador.
(P.185) Mas essas
manifestações dessas pessoas nessa nova imagem formada não se limitam a forma
visual, mas também a nomes, gestos e comportamentos conhecidos pelo sonhador em
estado de vigília. Freud explica que algumas vezes esse tipo de composição é
malsucedida e quando isso ocorre a cena no sonho é atribuída a uma das pessoas
em causa, e geralmente a pessoa menos importante, enquanto a outra ou as outras
pessoas aparecem como coadjuvantes em primeira vista, e são essas ou essa
pessoa exatamente a mais importante.
(P.186) Identificação e composição no
caso dos nomes próprios de localidades: nesse aspecto essas representações são
as mais fáceis de serem identificadas, já que não há interferência por parte do
ego. Estes mecanismos se utilizam de imagens compostas entre si que identificam
algum elemento “desejante comum” do sonhador. Combinando traços de ambas as
imagens em uma nova imagem, em um cenário que pode via a parecer absurdo.
(P.188) Freud disse
anteriormente que os sonhos não têm meios de expressar a relação de uma
contradição um contrário ou um não.
Justamente o inverso: confundem-se a
princípio com a ideia da contrariedade, mas diferencia-se no sentido de não
simbolizar ambiguidade como faz a contrariedade, mas sim de inverter e
contorcer um desejo recalcado. Está é muitas das vezes a melhor maneira de
expressar a reação de ego a um fragmento desagradável da memória. Além disso a
inversão tem uma utilidade muito especial como auxílio a censura, produzindo
uma distorção do material do sonho, quase o tornando incompreensível a
interpretação. Identificar a inversão e distorção é um passo significativo para
a interpretação do sonho.
(P.189) Intensidade e nitidez dos
elementos do sonho:
Freud explica que em um sonho quanto mais inteiro e /ou claro e intendo for um
elemento, maior será o número de cadeias de ideias e maior será a importância
daquele elemento, sendo determinante sua representação e interpretação. Mas
adverte dizendo que devido à censura do ego, invariavelmente estes elementos
nunca são o centro de um conteúdo manifesto.
(P.195) (D) Consideração à
representabilidade.
Nesta
parte Freud busca entender como nos sonhos sonhamos com coisas ou pessoas que
na verdade representam outras coisas.
Onde
alguns elementos simbolizam outros para poder escapar da censura. Geralmente
este simbolismo é usado para disfarçar o conteúdo sexual dos sonhos.
(P.201) (E) Representação por símbolos
nos sonhos – outros sonhos típicos.
(P.202) Já vimos que os
sonhos usam símbolos para representar certas coisas. Segundo Freud alguns
símbolos são “genéticos” e podem existir desde tempos imemoriais. A língua já
mudou, mas o símbolo persiste em nossos sonhos.
Os
sonhos se valem desse simbolismo para a representação disfarçada de seus
pensamentos. E muitos símbolos podem ser habitualmente utilizados para
expressar a mesma coisa.
(P.203) Os símbolos deixam
a interpretação dos sonhos mais difíceis, pois a interpretação correta só pode
ser alcançada, partindo-se do contexto.
Essa
ambiguidade dos símbolos parte da “superinterpretação”, fenômeno do sonho onde
num único conteúdo podemos encontrar desejos e pensamentos amplamente
divergentes.
Mas
em geral:
Rei
e rainha representam mãe e pai.
Príncipe
o próprio sonhador.
Armas,
fuzis, adaga, punhais e todos os objetos alongados representam o pênis.
Caixas,
estojos, arcas e todo recipiente representam ventre.
Subir
e descer escadas representa o ato sexual.
De
modo geral, tudo o que é pontiagudo simboliza o órgão sexual masculino, e tudo
o que é oco e possui entradas o órgão sexual feminino.
(P.221) Uma vez
entendido a importância do simbolismo, Freud divide os sonhos, grosso modo, em
duas classes: os que realmente tem sempre o mesmo sentido e os que, apesar de
terrem conteúdos idênticos ou semelhantes devem ser interpretados de maneira
variada. Devemos levar isso em consideração durante a análise dos sonhos típicos.
(P.227) Freud levanta a
questão de que a maioria dos sonhos dos adultos versa sobre material sexual e
dá expressão a desejos eróticos. Isso se dá porque nenhum outro pulsão é
submetido, desde a infância, a tanta supressão quanto o pulsão sexual. Gerando
assim poderosos desejos inconscientes, prontos a produzir sonhos no estado de
sono.
Contudo,
devemos nos lembrar que apesar de importantes, os complexos sexuais não são
exclusivos na formação do sonho.
(P.231) (F) Alguns exemplos – cálculos e
ditos nos sonhos.
(P.234) Hanns Sachs
(1911) “sabemos graças A Interpretação dos Sonhos de Freud, que o trabalho do
sonho se vale de diferentes métodos para dar forma sensorial a palavras ou
expressões. Se, por exemplo, a expressão a ser representada é ambígua, o
trabalho do sonho pode explorar esse fato utilizando a ambiguidade como uma
ponte de desvio: quando um dos sentidos da palavra está presente nos
pensamentos oníricos, o outro pode ser introduzido no sonho manifesto”.
(P.242) (G) Sonhos absurdos – atividade
intelectual nos sonhos.
No
curso de nossas interpretações dos sonhos esbarramos tantas vezes no elemento
do absurdo que não mais podemos adiar o momento de investigar sua origem e seu
eventual significado.
(P.248) Um sonho se
torna absurdo, quando o julgamento de que algo “é absurdo” figura entre os
elementos incluídos nos pensamentos oníricos. Isto é, quando qualquer das
cadeias de ideias inconscientes do sonhador tem por motivo a crítica ou a
ridicularização.
O
absurdo é um dos métodos pelos quais o trabalho do sonho representa uma
contradição – juntamente com outros métodos como a inversão, no conteúdo do
sonho, de uma relação material nos pensamentos oníricos, ou a exploração da
sensação de inibição motora.
O
absurdo num sonho destina-se a reproduzir o estado de ânimo dos pensamentos
oníricos que combina o escárnio ou o riso com a contradição.
(P.263) (H) Os afetos nos sonhos.
Devemos
dar atenção aos afetos que ocorrem durante os sonhos. “Se temo ladrões no
sonho, é certo, são imaginários – mas o temor é real”. Mesmo vale para a
alegria.
Um
afeto experimentado num sonho não é inferior a outro igual sentido na vida em
vigília. Porém em muitos casos não sentimos medo nos sonhos frente a
acontecimentos horripilantes e sentimos medo de coisas banais.
Explicar
isso fica mais fácil quando passamos do conteúdo manifesto para o conteúdo
latente dos sonhos. Onde o material de representações passa por deslocamentos e
substituições, enquanto os afetos permanecem inalterados.
O
exemplo usado por Freud é o de uma moça que sonha com três leões e não sentiu
medo. Isso porque os três leões representavam pessoas próximas a ela, entre
eles seu pai.
(P.279) (I) Elaboração secundária.
Trabalharemos
agora com o quarto fator implicante na formação dos sonhos. Prosseguindo de
onde iniciamos (isto é, comparando
eventos manifestos no conteúdo do sonho com suas fontes nos pensamentos
oníricos).
(P.280) O que Freud tem
em mente são casos em eu o sonhador fica surpreso, irritado ou enojado no sonho
com algum fragmento do pensamento onírico. Em geral o sentimento crítico não se
dirige ao conteúdo do sonho, mas ao pensamento onírico que está por trás dele. Mas
se sem todos os sonhos decorrem dos pensamentos oníricos, pode haver um segundo
elemento participando de sua elaboração.
Freud
considera a censura como parte influente no sonho. Pois, quantas vezes enquanto
sonhávamos não dizemos a nós mesmos “isso é apenas um sonho”. Ou seja, a
censura não apenas barra conteúdos indesejados como também participa
efetivamente do sonho.
(P.281) Ela preenche as
lacunas da estrutura do sonho, deixando-o menos absurdo e incoerente.
(P.289) Então Freud
chama a atenção para o que ele considera o quarto elemento constitutivo de um
sonho: a elaboração secundária ou fenômeno de Silberer.
Elaboração
secundária nada mais é que a modificação do sonho feito, feito pela censura,
para que ele seja menos incoerente e menos absurdo.
*Lembrando
que os quatro elementos constitutivos dos sonhos para Freud são: condensação,
deslocamento, representação e elaboração secundária.
FREUD, Sigmund. Interpretação dos Sonhos. 1ª Ed. São Paulo. Folha de S. Paulo, 2010. P.159-290.
Nenhum comentário:
Postar um comentário