Vida
Material.
Neste capítulo Caio Prado Jr apresenta as bases de suas teorias sobre a economia do Brasil colonial. Fala sobre o sistema plantation, a vocação para a exportação e como a resposta para a instabilidade econômica do país pode estar no caráter de sua formação, uma vez que nossa economia se baseia em ciclos de demanda estrangeira com prazo de validade bem definido. Ou segundo suas palavras "Esta evolução cíclica, por arrancos, em que se assiste sucessivamente ao progresso e ao aniquilamento, uma atrás da outra".
Lançado em 1942 "Formação do Brasil Contemporâneo", infelizmente em alguns pontos, ainda permanece tão contemporâneo quanto no dia de sua publicação.
Boa Leitura.
Cap
6: Economia.
(P.119) Como já vimos
anteriormente o “sentido” da economia da colônia era o de fornecer ao comércio
europeu gêneros tropicais e minerais como o açúcar, o ouro ou o algodão. E que
nossa economia se subordina inteiramente a este fim, isto é, se organiza e
funciona para produzir e exportar aqueles gêneros.
Vejamos agora como se organizava
a produção de tais gêneros que fazem a base da riqueza e das atividades da
colônia.
Na agricultura o elemento
fundamental será a grande propriedade monocultural trabalhada por escravos. E
este tipo de organização agrária não resulta de uma simples escolha,
alternativa eleita entre outras que se apresentaram a colonização.
(P.120)
Os
três caracteres apontados: a grande propriedade, monocultura e trabalho
escravo, são formas que se combinam e se completam.
Já vimos no primeiro capítulo o
tipo de colono europeu que procura os trópicos e nele permanece. Não é o
trabalhador, o simples povoador; mas o explorador, o empresário de um grande
negócio. Vem para dirigir e só vai para o campo como grande empresário rural,
onde figure como senhor. Vemos assim que de início, salvo algumas áreas ao sul,
são grandes as áreas de terra que se concedem aos colonos no Brasil.
Não ocorreu-lhes em nenhum
momento a ideia de tentar sequer um regime de outra natureza, como uma
organização camponesa de pequenos proprietários.
Teria influído nesta orientação a
experiência que Portugal já adquira da colonização dos trópicos, mas seja por
isso ou não, o fato é que as condições naturais da colônia vinham ao encontro
da política adotada. A experiência demonstra que a grande propriedade, como
organizada no Brasil, representa o sistema de organização agrário que sempre acaba
dominando nos trópicos, mesmo quando outros tipos são inicialmente tentados.
Pois, combinam-se as dificuldades
que o meio natural oferece ao trabalho de indivíduos isolados, sobretudo quando
se trata de desbravamento.
(P.121)
Nas
colônias inglesas da América do Norte, por seu tamanho e climas diferentes,
podemos perceber que: nas de clima temperado estabelece-se a pequena
propriedade do tipo camponês em sua grande maioria. A pequena exploração
realiza-se pelo próprio lavrador e quando muito por um pequeno número de
subordinados.
Ao sul, mais quente e úmido e com
características subtropicais estabelece-se a grande propriedade, trabalhadas
por escravos. É o chamado sistema Plantation.
Neste momento do livro Caio Prado
Jr dá diversos exemplos de como o clima é determinante sobre a forma de
colonização.
A monocultura acompanha
necessariamente a grande propriedade tropical; os dois são fatos correlatos e
derivam das grandes causas. A agricultura tem por objetivo único a produção de
certos gêneros de valor comercial e por isso são altamente lucrativos.
(P.122)
Com
a grande propriedade monocultural instala-se no Brasil o trabalho escravo. Não
só Portugal não contava com população suficiente para abastecer sua colônia de
mão-de-obra, como também já vimos que o colono europeu não emigrava para os
trópicos para se tornar trabalhador.
A escravidão torna-se assim uma
necessidade e não tardou muito para que na colonização dos trópicos americanos
renascesse a escravidão na civilização ocidental, em declínio desde o fim do
Império Romano.
Utilizaram-se a princípio os autóctones.
Nas regiões como no México ou nos altiplanos andinos onde a densidade era
grande e onde eles estavam habiatuados a trabalhar, o indígena formou a grossa
mão-de-obra escrava.
No Brasil onde o indígena era
mais escasso e menos educado para o trabalho organizado, empregou-se o escravo
africano.
Completam-se assim os três
elementos constitutivos da organização agrária do Brasil colonial: a grande
propriedade, a monocultura e o trabalho escravo.
Estes três elementos se conjugam
num sistema típico, “a grande exploração rural”, isto é, a reunião numa mesma
unidade produtora de grande número de indivíduos; é isto que constitui uma célula
fundamental da economia agrária brasileira. Como constituirá também a base
principal em que se assenta toda estrutura do país, econômica e social.
(P.123)
No
Brasil temos a grande propriedade somada a grande exploração.
No século XVIII a mineração fará
par com a agricultura entre as grande atividades econômicas da colônia. E esta
tomará a mesma forma da agricultura: exploração em larga escala. Ou seja,
grandes unidades, trabalhadas por escravos. A mineração individual e
aventuresca ocorrerá somente quando este ciclo minerador estiver em franco declínio.
O terceiro setor das atividades fundamentais
da economia brasileira é o extrativismo. Este quase que exclusivamente
praticado no vale do amazonas. Esta atividade se organizará diferente, uma vez
que os colhedores possuem a liberdade de vagar pela floresta em busca de
especiarias. Contudo, encontramos aqui o chamado empresário, que embora não
seja proprietário fundiário como o fazendeiro e o dono de mina, organiza a mão-de-obra
que trabalha sob suas ordens.
(P.124)
Além
destas atividade, existiam na colônia atividades que Caio Prado Jr chama de
secundárias: a pecuária e a agricultura. Eram atividades subsidiárias
destinadas a amparar e tornar possível a realização das primeiras. Ou seja,
essas atividades não caracterizam a economia colonial brasileira, mas lhe
serviam apenas de acessório para sua realização.
Agora em relação aos elementos
fundamentais e característicos da economia colonial, organizada na unidade
produtora, seja agrícola, mineradora ou extrativista podemos explicar a extrema
concentração de riqueza que caracteriza a economia colonial.
(P.125)
São
estas em suma, as características fundamentais da economia colonial brasileira:
de um lado, esta organização da produção e do trabalho e a concentração de
riqueza que dela resulta; do outro, a sua orientação voltada para o exterior e
como simples fornecedor do comércio internacional.
Nestas bases se lançou a
colonização brasileira e nela se conservará sem grandes modificações durante os
três primeiros séculos de nosso história.
(P.127)
E
este sistema se tornou tão intrínseco ao Brasil que mesmo após sua independência
continuou a existir. Pois, pela própria natureza dessa estrutura, não podíamos ser
outra coisa mais que o que fôramos até então: uma feitoria da Europa, um
simples fornecedor de produtos tropicais para seu comércio.
Deste sistema resultará,
portanto, uma consequência final muito grave: é a forma que tomou a evolução
econômica da colônia. Uma evolução cíclica, tanto no tempo, como no espaço, em
que se assiste sucessivamente a fases de prosperidade estritamente localizada,
seguidas depois de maior ou menor lapso de tempo, mas sempre curto, do aniquilamento
total. Foi assim com o açúcar, o ouro, os produtos agrícolas como novamente o açúcar
e o algodão, o café, etc.
(P.128)
Esta
evolução cíclica, por arrancos, em que se assiste sucessivamente ao progresso e
ao aniquilamento, uma atrás da outra tem sua origem no caráter da economia
brasileira.
Pois esta se organiza em
objetivos estranhos ao país. Subordina-se a uma determinada conjuntura
internacional favorável naquela momento a um produto qualquer que é capaz de
fornecer e impulsionar o seu funcionamento, dando a impressão ilusória de
riqueza e prosperidade. Bastando apenas que esta conjuntura se desloque um
pouco para que aquela produção declina e pereça, tornando impossível manter a
vida que ela alimentava.
Fonte: PRADO JÚNIOR,
Caio: Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo. Ed Brasiliense. 7ª
reimpressão, da 23ª edição de 1994. Pág 119-129.
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