quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Questões de Economia Internacional.



Por:William C. T. Rodrigues
Claudia Paola Silva Vera
O Que é Desenvolvimento para Adam Smith?
Para Adam Smith a base do desenvolvimento e riqueza de qualquer nação, esta na divisão social do trabalho. Negando as teorias de seus contemporâneos de que a divisão do trabalho seja algo somente viável em pequenas manufaturas, Smith alega que a divisão do trabalho pode sim ser implantada até mesmo em grandes complexos industriais.
Para a defesa de sua tese o autor cita três fatores derivados da divisão do trabalho que exemplificam e provam que este modelo de produção é o mais viável e produtivo: 1° o aumento da destreza dos operários, pois desempenham somente uma função durante toda vida, 2° economia de tempo perdido na passagem de um trabalho para o outro e 3° o surgimento de máquinas que facilitam e aceleram o trabalho.
Um exemplo muito recorrente quando se cita Smith, e sua defesa pela divisão do trabalho, é a do alfineteiro: um ferreiro, por melhor que seja no desempenho de seu oficio, consegue sozinho produzir no máximo vinte alfinetes – de baixa qualidade – em um dia de trabalho duro.  Enquanto que em uma manufatura onde o trabalho seja dividido – um corta o arame, outro afia, outro coloca a cabeça e assim por diante – consegue produzir milhares de alfinetes no mesmo espaço de tempo.
Essa ânsia pela produção é própria do homem que, diferente dos animais, consegue estabelecer relações de troca através do comércio e da barganha. Um homem que durante sua vida percebe ser bom em determinado ofício, pode durante sua existência, deixar de caçar, coletar, plantar e dedicar-se somente a este trabalho integralmente.
Sem esta divisão de ofícios, que já vem de longa data, os homens seriam obrigados a produzir tudo o que necessitam para sua sobrevivência e uma vida só seria curta para a aquisição de tantos bens materiais. Ou seja, entre os homens as habilidades de uns suprem as necessidades de outros desde tempos imemoráveis.
Entretanto, a divisão do trabalho e o considerável aumento de produtividade por ela acarretada, esbarra no tamanho do mercado consumidor que o cerca. Uma empresa situada a milhares de quilômetros dos grandes centros não pode aumentar, de uma só vez, sua produção. Pois isso geraria um enorme aumento da oferta em relação à demanda[1].
Por isso é comum em locais afastados o desempenho de varias funções por um só profissional. É menos rentável, menor ágil, porém infinitamente mais viável em regiões afastadas.

Quais as críticas ao eurocentrismo por Amayo Zevallos?
No minidicionário Silveira Bueno de língua Portuguesa a palavra eurocentrismo é descrita como “que tem como centro a Europa; que refere tudo aos valores da cultura europeia”. Entretanto, mais que isso, o eurocentrismo é uma ideologia de dominação que foi difundida por todo o mundo a partir do século XVI - século inicial da conquista do continente pelos europeus.
Segundo Amayo Zevallos o eurocentrismo foi “um fenômeno histórico-social que considera a história mundial como uma mera extensão da história europeia”. Um exemplo bem evidente disto são os livros didáticos de história “geral” que só agregam a história latino-americana como um apêndice da história europeia, como se nosso continente só tivesse história a partir do contato com esta civilização.
Esta ideologia, segundo o autor, é formada por uma mescla de arrogância e – uma falsa ideia de – superioridade, que juntos compõe o racismo característico aos povos nativos.
Como surgiu o eurocentrismo? Segundo o autor, os europeus ao desembarcarem nas praias do continente e dar início a conquista e pilhagem, deveriam justificar seus atos. Assim, a teoria que melhor se enquadrou ao ímpeto assassino do conquistador europeu foi o eurocentrismo, que justificava suas ações com base na superioridade do homem do velho continente em detrimento da inferioridade do nativo-americano, tido como bárbaro, inculto e selvagem.
O homem europeu era o possuidor de tudo enquanto o indígena em sua inferioridade não possuía nada e seu extermínio não representaria grandes perdas para a civilização, tida como avançada.
Uma citação que o autor utiliza no texto que ilustra bem esta ideia é a de Hobsbawm que afirma que “o ano de 1942 marca o início da história mundial eurocêntrica, da convicção de que uns poucos países europeus centrais e ocidentais, estavam destinados a conquistar e governar o globo, a euro-megalomania”.
A grande crítica de Zevallos ao eurocentrismo baseia-se na negação desta ideia de superioridade tecnológica dos povos europeus. Segundo o autor a Europa possuía uma tecnologia superior a nativo-americana em algumas áreas do conhecimento, como por exemplo, na metalurgia. Entretanto, em outras áreas os povos indígenas eram extremamente mais avançados que os europeus; como na agricultura.
A grande contradição aqui, é que a tecnologia dos europeus serviu para dizimar os indígenas, enquanto a tecnologia agrícola nativo-americana, exportada para a Europa serviu para acabar com a fome no velho continente.



[1] O autor não utiliza estes termos.


segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

O que é Direito.


Quais as relações entre Direito e Justiça, Direito e ideologia, Direito e conflito social? Em linguagem clara e precisa, o professor Roberto Lyra discute as várias dimensões do direito, apresentando-o não como conjunto imutável de regras, mas como atividade em permanente transformação. 
O Que é Direito.
Este livro faz parte da coleção Primeiros Passos da editora brasiliense, fundada em 1943 pelo importantíssimo intelectual marxista brasileiro Caio Prado Junior, coleção esta que tem como objetivo, segundo consta no próprio site da editora, a publicação de textos leves e introdutórios nas mais diversas áreas do conhecimento. E como não poderia deixar de ser, graças a corrente de pensamento do fundador da editora, todos os livros desta coleção seguem a linha filosófica marxista, inclusive este.
Roberto Lyra Filho ao escrever esta pequena brochura de pouco mais de sessenta páginas, nos introduz a instigante e complicada área que é o direito, tendo como fio condutor muito bem delineado, o marxismo e a ideia de luta de classes aplicado a criação de leis e a forma como estas se legitimam ou não perante a sociedade.
Inicialmente, o autor distingue as palavras Direito e Lei. Segundo ele, apesar de aparecerem em algumas línguas como homônimas como no inglês, por exemplo, representam coisas diametralmente distintas.
Fica claro durante o primeiro capítulo do livro que Lei é um artificio do Estado de controle social (Estado este, que segundo Marx, nada mais é do que um instrumento de dominação de uma classe sobre outra). E que Direito são conquistas adquiridas dentro da ordem estabelecida e cerceadas pelas leis.
Esse fenômeno de cerceamento do Direito pela Lei fica explícito na passagem “Direito e Lei pertencem ao repertório ideológico do Estado, pois na sua posição privilegiada ele deseja convencer-nos de que cessaram as contradições, que o poder atende ao povo e que tudo o que vem dali é imaculadamente jurídico, não havendo Direito (...) acima das leis”. (P.03)
Em seguida no segundo capítulo intitulado Ideologias Jurídicas, Lyra Filho inicia o debate com a seguinte questão: o que é ideologia? Segundo o autor o termo passou por mudanças significativas ao longo dos séculos. Inicialmente, indicava o estudo do funcionamento das ideias em relação aos signos e posteriormente passou a designar a própria ideia.
A ideologia funciona como uma espécie de ideia pré-fabricada sobre tudo, ela guia nosso pensamento de forma a encaixar até as coisas mais absurdas dentro desta visão de mundo. Ou nas palavras do próprio autor, uma estrutura de opiniões organizadas em certos padrões, que não aceitam críticas, e que muitas vezes não condizem com a realidade. (P.08)
O autor segue durante todo o capitulo citando os mais variados pensadores como Karl Marx, Ortega y Gasset, etc, sobre o que cada um entende por ideologia e como ela é concebida.
Em um apanhado geral a ideologia se caracteriza por ser: uma ideia pré-fabricada, transmitida pelo Estado, instituições, sociedade, família, etc. de forma passiva e inconsciente, que gera –segundo Marx- uma cegueira parcial da inteligência.
Neste ponto do livro o autor citando Dalmo Dallari nos apresenta o ponto de partida deste livro: “na realidade, o direito usado para dominação e injustiça é um direito ilegítimo, um falso direito”. Ou seja, o livro utilizará como fio condutor a crítica a maneira burguesa de se conceber o Direito e a justiça.
Para Lyra Filho existem duas principais ideologias jurídicas (existem mais, entretanto estão são as duas mais importantes), o Direito Positivo e o Direito Natural que se polarizam em diversos subgrupos.
No positivismo a ordem é a Justiça. Ideologia predominante entre os juristas contemporâneos, o positivismo baseia-se na ordem. A sociedade é justa porque é ordenada. Esta ideologia jurídica tem como apoio a ordem estabelecida, os costumes de uma classe (neste caso a classe dominante) são transformados em leis pelo Estado, que utiliza de todos os meios possíveis para aplica-las a toda a sociedade, utilizando-se até mesmo da violência para se fazer valer. Segundo os Jusnaturalistas o positivismo “serve apenas para fazer valer a ordem estabelecida”.
Jusnaturalismo.
Ideologia mais antiga remete ao surgimento das civilizações. Tem como base o Direito como ordem justa. A ideia aqui é a justiça “a sociedade é ordenada porque é justa”. O direito natural é dividido em grupos: o direito natural cosmológico, o direito natural teológico e o direito natural antropológico. Liga os direitos dos homens a fatores ditos da “própria natureza das coisas”, seja ela terrestre ou teológica. O que, assim como a ideóloga positivista, apenas serve para justificar a ordem estabelecida. Um exemplo muito bom utilizado pelo autor é a escravidão na América de índios e negros, justificada pela Igreja com base em leituras da Bíblia.
Neste ponto o autor inicia sua abordagem do Direito por um viés sociológico marcadamente marxista. Para ele a sociologia como ciência abre as portas para uma análise mais pura, através dos fatos históricos, sobre as origens da sociedade e como está se desenvolveu até hoje, mais até mesmo do que a história.
Em linhas gerais os últimos capítulos de texto nos apresentam uma junção do materialismo dialético com as estruturas do Direito. Como bom marxista aplica o internacionalismo ao Direito junto com a ideia de periferias e centros internacionais e seus constantes atritos. Internamente as lutas de classe, sempre geraram e gerarão conflitos sendo necessário uma grande transformação que segundo ele pode ser ou reformista ou revolucionária, mas é evidente sua simpatia a via revolucionária.
A partir da página 46 ele cita nove pontos de sua estrutura do pensamento dialético aplicado ao Direito que permitiria a um jurista se esquivar deste dualismo entre positivismo e Jusnaturalismo, apresentando uma nova forma de se conceber o Direto.
Considerações Finais.
Ao decorrer do texto surgiram algumas dúvidas que só se resolveram a partir de conversas com amigos desta área. Assim que peguei o livro em mãos com o título, O que é Direito pensei que o termo Direito se referia a disciplina Direito ao exercício da advocacia em si. Somente no decorrer das páginas tomei consciência de que o termo Direito aqui utilizado se referia ao “conjunto de normas de conduta impostos pelo Estado para regular as relações sociais”. Algo, que pode parecer bobagem a alguém da área, mas que faz toda diferença aos leigos.
Contudo, o livro cumpre o objetivo da coleção que é ajudar o leitor a dar os “primeiros passos” rumo ao conhecimento da área e a partir daí conseguir uma abordagem mais profunda com base em futuras leituras.
Bibliografia:
FILHO; Roberto Lyra: O Que é Direito. São Paulo. Ed Brasiliense. 11ª ed. 1982.
Sites:

[1] O autor cita 3 subdivisões do Positivismo (o positivismo legalista, historicista ou sociologista e o psicologista), os quais achei melhor não citar no corpo do texto.


terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Meu primeiro conto: O dia em que Antônio conheceu Manu.

Inspirado nos livros de Bukowski resolvi escrever meu primeiro conto. Muito humildemente espero que gostem. Criticas são bem-vindas.

O dia em que Antônio conheceu Manú.
Por: William C. T. Rodrigues
Já passava das onze da noite, o bar estava praticamente vazio como de costume nesse horário, em especial pelo fato de ser um segunda-feira. O dono do bar esperava para encerrar o expediente.
A noite não havia sido muito rentável, os poucos bêbados imundos que apareceram bebiam cachaça e logo se embriagavam com o custo de apenas algumas moedas.
O bar era escuro, fétido e com um nome extremamente de mau-gosto, “toca da onça”. Em todo lado se amontoavam quinquilharias que o dono teimava em chamar de decoração. Havia desde animais empalhados até espingardas cartucheiras que ele dizia ser da época da Guerra do Paraguai.
No fundo do bar, ao lado dos banheiros e encoberto pela sombra do engradados de cerveja, um homem estava sentado tomando seu último gole de conhaque. Sua presença era praticamente imperceptível, sendo denunciada apenas pelo pequeno ponto laranja incandescente que se formava a cada tragada em se cigarro contrabandeado.
O tédio, o passar das horas, a monotonia que o dilacera a cada segundo é algo que lhe dilacera o peito. Claro o que esperar de uma vidinha assim; trabalho pesado durante o dia, embriaguez durante a noite em uma rotina que beira o ridículo da existência, ele não vive apenas existe.
Foi neste momento, perdido em seus pensamentos imbecis de uma pessoa imbecil, que ele notou a chegada de uma mulher ao bar. Ela vacilou e parou alguns minutos na porta. O coração dele bateu mais forte. Ela olhou ao redor e notou meia dúzia de homens feios, embriagados e fedidos. Ele com os olhos vidrados deu mais uma tragada no cigarro, a pequena luz da brasa iluminou seus olhos que refletiram como os de um gato. Ela o notou e caminhou em sua direção.
Ela era extremamente feia, a pela parecia uma uva passa, seus cabelos loiros e ondulados estavam tão ensebados que formavam pequenos dreadlocks nas pontas. Seu caminhar era desajeitado e formava uma combinação perfeita com o velho vestido, o velho sapato e o batom, todos extremamente vermelhos.
A dois passos da mesa ela parou o fitou por alguns segundos e perguntou:
-Qual seu nome?
-Antônio. -respondeu.
-Saia do escuro quero ver seu rosto.
Antônio não respondeu apenas arrastou a mesa meio metro para a luz.
-Nossa você muito bonito!
Ele não era bonito, apenas era menos feio que ela. Tinha traços fortes que remetiam a uma beleza que ficou no passado, mas o trabalho duro no sol e as dificuldades da vida, além do álcool e do tabaco lhe transformaram em um homem de feiura mediana.
-Você acha é? – Perguntou.
-Sim eu acho.
Um sorriso desajeitado surgiu em sua boca murcha de dentes amarelos, deixando sua feiura mediana muito mais mediana.
-Meu nome é Manu. Eae você quer trepar?
-Hã?
-É trepar. Eu cobra “vintão” meia hora. Só estou cobrando porque quero comprar umas rochas.
-É que eu não tenho dinheiro.
-Então “deizão” e eu te faço um boquete.
-Não tenho princesa, hoje mandei pendurar tudo na conta.
Manu levantou as sobrancelhas, olhou Antônio dentro dos olhos por alguns segundos e retirou-se, caminhando na direção de outro homem.
Antônio voltou para a escuridão e escutou quando Manu disse a um senhor de 80 anos de idade ou 40 de cachaça (é difícil distinguir).
- Trinta reais meia hora.
O senhor não disse nada, apenas sacou o dinheiro do bolso e lançou sobre a mesa. Passou o braço sobre seu pescoço e caminhou com ela em direção uma Belina marrom 73 de onde partiram. Com certeza em direção a um canavial que ficava a 10 minutos do bar.
Antônio sentiu uma pontada de ciúmes e pensou consigo mesmo:
-Porra, perdi um boquete.

Fim.

sábado, 10 de novembro de 2012

Fichamento: Circe Maria F. Bittencourt " O uso didático dos documentos".



 Resumo:
O uso de documentos em sala de aula é bastante valioso. O documento permite aproximar o aluno de vários conteúdos, seja ilustrando um contexto e colorindo-o com os afetos envolvidos na sua produção, seja humanizando os eventos distantes, seja convidando o aluno a procurar os vestígios escondidos nele para enxergar como era determinada época. Entretanto, como utilizá-lo? O aluno deve ser transformado pelo professor em um mini-historiador? Estas e outras questões serão debatidas pela grande historiadora Circe Bittencourt.
Boa Leitura.


(P. 327) Cap. 02: Uso didático dos documentos.
Alguns historiadores acreditam que o uso de documentos nas aulas de História é importante por favorecer a introdução do aluno no pensamento histórico e nos métodos de trabalho do historiador. Essa pretensão acarreta uma série de dificuldades ao ensino e contraria os objetivos da disciplina, cujo objetivo é desenvolver a autonomia intelectual.
(P. 328) Daí a necessidade de se deter em alguns aspectos do uso de documentos ou de fontes históricas nas aulas de História. Começando pela identificação das especialidades desse uso.
1. Análises de documentos.
1.1. Historiadores e professores: diferentes usos das fontes históricas.
É um erro tentar transformar o aluno em um “pequeno historiador” uma vez que os documentos para os historiadores tem outra finalidade. Para eles, os documentos são a fonte principal de seu ofício, a matéria-prima por intermédio do qual escrevem história.
(P. 329) Para Henri Moniot, o historiador, ao selecionar suas fontes de pesquisa, já possui um conhecimento histórico sobre o período e tem domínio de conceitos e categorias fundamentais para uma análise histórica. Ao usar um documento transformado em fonte de pesquisa, o historiador parte, portanto, de referenciais e de objetivos muito diferentes aos de uma sala de aula. As fontes históricas em sala de aula serão utilizadas diferentemente, pois os jovens estão “aprendendo história” e não dominam o contexto histórico em que o documento foi produzido.
(P. 330) Um documento pode ser utilizado como um reforço de uma ideia, como fonte de informação, ou introduzir uma situação problema. O maior desafio para o professor é a seleção desse recurso de acordo com a capacidade intelectual de seu aluno. Deve-se ter em mente que textos com vocabulário muito complexo, longos e inadequados a idade do aluno produzem mais dificuldades que interesse e curiosidade.
(P. 331) O objetivo é favorecer sua exploração pelos alunos, com textos claros, compreensíveis e curtos. O contrário disto pode causar uma rejeição pelo tema.
Para que o documento se transforme em material didático significativo é importante haver sensibilidade ao sentido que lhe conferimos enquanto registro do passado. Nessa condição, convém aos alunos perceberem que tais registros e marcas do passado são os mais diversos e se encontram em toda parte; livros, revistas, quadros, músicas, filmes, fotografias, etc.
1.2. Métodos de Análise de Documentos.
No artigo “Reflexões sobre o procedimento Histórico” o historiador Adalberto Marson mostra a importância do uso de documentos em sua investigação, para e seguida se apropriar do procedimento de análise.
(P. 332) É importante, para a compreensão do documento, que se faça uma análise dele como sujeito de uma ação e também como objeto, formulando três níveis de indagação:
1) Sobre a existência em si do documento: o que vem a ser documento? O que é capaz de dizer? Como podemos recuperar o sentido do seu dizer? Por que tal documento existe? Quem o fez, em que circunstância e para qual finalidade?
2) Sobre o significado do documento como objeto: o que significa como simples objeto (isto é fruto do trabalho humano)? Como e por quem foi produzido? Para que e para quem se fez esta produção? Qual é a relação do documento (como objeto particular) no universo da produção? Qual a finalidade e o caráter necessário que comanda sua existência?
3) Sobre o significado do documento como sujeito: por quem fala tal documento? De que história particular participou? Que ação e que pensamento estão contidos em seu significado? O que o fez perdurar como depósito da memória? Em que consiste seu ato de poder?
(P. 333) Para Elias Saliba, vale a pena refletir sobre a distinção entre documento (produzido voluntária ou involuntariamente pela sociedade segundo determinadas relações de força), e o monumento (voluntariamente produzido pelo poder, ou seja, por que detém o poder de sua perpetuação). O que transforma o documento em monumento é a sua utilização pelo poder. Entenda-se: o poder da produção, difusão, edição, manipulação, conservação, reciclagem ou descarte.
O uso de documentos nas aulas de história justifica-se pelas contribuições que pode oferecer para o desenvolvimento do pensamento histórico. Uma delas é facilitar a compreensão do processo de produção do conhecimento histórico pelo entendimento de que os vestígios do passado se encontram em diferentes lugares, fazem parte da memória social e precisam ser preservados.
Outra exigência para se uso é o cuidado para com as diferentes linguagens. São muito variadas quanto à origem e precisam ser analisados de acordo com suas características de linguagem e especificidades de comunicação. Como recursos didáticos, distinguem-se três tipos: escritos, materiais (objetos de arte ou do cotidiano, construções...) e visuais/audiovisuais (imagens fixas ou em movimento, gráficas ou musicais).
De modo geral ao analisar um documento devem-se articular os métodos do historiador com os pedagógicos. Uma boa proposta seria o esquema a seguir:
Fazer análise e comentário de um documento corresponde a:
(P. 335) 2. Documentos escritos: jornais e literatura.
São aos mais comumente utilizados em sala de aula, podem ser textos legislativos, artigos de jornal e revistas de diferentes épocas, trechos literários, poemas e letras de música.
2.1. Imprensa Escrita nas aulas de história.
A imprensa escrita como fonte e objeto de estudo histórico foi abordado por vários historiadores. Maria Capelato, em Imprensa e História do Brasil, ressalta que há vários tipos de imprensa, assim como vários modos de estuda-la.
As possiblidades de utilizar jornais como fonte histórica são múltiplas: análise dos conteúdos das notícias (politica, economia, cultura), da forma como as notícias são apresentadas, as propagandas, os anúncios, as fotografias e de como estão distribuídas.
(P. 336) Neste contexto o jornalista é um agente significativo na criação de fatos históricos. Entretanto, não podemos nos esquecer que o Jornal além de ser um objeto de cultura é também uma mercadoria fruto de uma empresa capitalista. Por sua influência, o jornal vem sendo analisado como um formador de opinião pública ligado a interesses variados fazendo parte do jogo politico e do poder. Nesse contexto, tem sido analisado tendo como contraponto jornais de sindicato por exemplo.
Outro tema comumente abordado no Brasil refere-se a censura, em especial no período entre 1964- 1985. Na história escolar, os documentos têm servido como material de aprendizagem em livros, provas e vestibulares. Em especial em temas de história contemporânea.
(P. 337) O importante no uso de textos jornalísticos é considerar a notícia como um discurso que jamais é neutro ou imparcial. Isso é necessário para que se possa realizar uma crítica referente aos limites do texto e aos interesses de poder implícitos nele.
(P. 338) 2.2. Literatura como documento interdisciplinar.
Romances, poemas, contos são textos que contribuem, pela sua própria natureza, para trabalhos interdisciplinares.
(P. 340) Os estudos de textos literários têm assim como objetivo não apenas desenvolver “o gosto pela leitura”, mas também fornecer condições de analises mais profundas para o estabelecimento de relações entre conteúdo e forma.
(P. 342) Para a história, esse referencial torna-se possível analisar textos literários como documentos de época, cujos autores pertencem a determinado contexto histórico e são portadores de uma cultura exposta em suas criações, seguidores de determinada corrente artística e representantes de seu tempo.
3. Os documentos escritos canônicos.
3.1. Documentos oficiais e cidadania.
Entre os documentos escritos, os produzidos pelo poder institucional são bastante usuais na pesquisa historiográfica, notadamente naquela afinada com a tradição de uma história politica que se preocupa com o poder institucional e privilegia o papel do Estado nas transformações históricas. Entretanto, em livros didáticos não é comum encontrarmos documentos legislativos. Contudo existem algumas exceções como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789).
(P. 343) Tem sido comum a temática em torno da constituição da cidadania, noções de direito, ética e poder que se manifesta no cotidiano das pessoas, fazendo-se assim análises nos documentos pessoas dos alunos.
3.2. Proposta de trabalho com dossiês temáticos.
Umas das demandas dos professores de história é a constituição de coletâneas de documentos sobre determinados temas. A proposta aqui apresentada é a constituição de um dossiê de documentos sobre um tema de estudo. Buscando vários elementos sobre um mesmo tema a fim de confrontá-los e compará-los.
(P. 348) Os documentos devem ser cuidadosamente escolhidos para uso pedagógico, não sendo aconselháveis textos longos ou com vocabulário difícil para o aluno. Um trabalho com documentos pressupõe, além dos procedimentos metodológicos de análise interna e externa, atividades que favoreçam o debate e a escrita, as quais podem obedecer às seguinte etapas:
-Iniciar com uma leitura integral para a apreensão do problema ou tema central;
- Decompor as informações para que o aluno estabeleça relações entre as informações e as que já possui;
- Identificar a forma pela qual as informações e conceitos são apresentados;
-Estabelecer uma hierarquia pela qual as informações com destaque às mais importantes e relevantes;
- Finalmente, retomar o texto em sua integralidade para uma última leitura, Comparando a leitura inicial com a final.
Leia também:
 Bibliografia:
BITTENCOURT; Circe Maria F: Ensino de História: Fundamentos e Métodos. São Paulo. Ed Cortez, 2004. Pág 325-350.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Os Sujeitos das Relações Internacionais.



 Resumo:
 O presente texto escrito por Lleana Cid Capetillo em conjunto com Pedro Gonzáles Olvera, busca desconstruir o léxico referente à utilização da palavra “ator” das Relações Internacionais. Segundo eles um termo vazio, que apesar de sua ampla utilização, não possui um respaldo teórico-metodológico. Por seguirem a linha marxista da disciplina, acreditam que a terminologia mais correta seria “sujeito”. Uma vez que este termo lhes garante o controle sobre sua própria história e por conseguinte as Relações Internacionais por ele desencadeada.
Boa leitura.
(P. 193) Os Sujeitos das Relações Internacionais.
Em nossa disciplina é comum o uso do termo “atores” das Relações Internacionais. Término este vazio, sem conceptualizações e conteúdo teórico. Isso não impede que diversos autores o reconheçam na sociedade internacional. Assim, se diz que o ator por excelência é o Estado, uma vez que concentra a representação legal e é reconhecido pela sociedade.
Inicialmente, negamos o término ator, por ser proveniente de uma proposição teórico-metodológica (o funcionalismo) que não compartilhamos.
Aqui utilizaremos os termos rolstatus e grupos sociais. O rol será a conduta de cada um dos indivíduos de acordo com o status que ocupe, que por sua vez se define com a posição que o individuo ocupa no conglomerado social. Assim o “ator” será o indivíduo possuidor de um rol e um status. E como não desempanha seu papel isoladamente, aqui incorporamos o conceito de grupo social.
(P. 194) Existem várias razões para a desqualificação do término ator pelas Relações Internacionais: um ator não cria o cenário que atua, ele apenas desempenha seu papel em um cenário pré-estabelecido. O término ator carece de um conteúdo teórico-metodológico que o justifique e o sustente como conceito.
Por outro lado, dentro do marxismo encontramos o conceito adequado: o conceito de sujeito da história. Esta opção pelo término “sujeito” no lugar de “ator” não é meramente questão de vocabulário.
O conceito de sujeito nos remete a uma concepção do homem como um ente dinâmico, no sentido que suas práticas são o motor dos processos sociais. Desta forma, ao invés de concebê-lo como alguém que tem que representar papéis pré-estabelecidos por alguma entidade superior, as vezes desconhecida, e desenvolvidos em cenários igualmente impostos a ele, o sujeito se caracteriza por sua capacidade intrínseca para levar a cabo uma prática social entendida como u complexo de atividades e ações que tem como resultado concreto o desenvolvimento social.
Esta prática social possui duas características principais:
1ª se apresenta desde o momento em que o homem superando sua condição de animalidade, se relaciona com a natureza para satisfazer suas necessidades. Este vínculo provoca um duplo processo de transformação na natureza e no homem, que repercute no desenvolvimento das forças produtivas e nas formas político-sociais de organização humana.
2ª A coletividade do ser humano deve ser entendida em um contexto coletivo, pois, as relações homem-natureza não se dão de forma isolada, mas sim mediada pela forma em que o indivíduo se relaciona com outros indivíduos. O homem vive e se desenvolve sempre em comunidade onde as ações se incubem a todos seus membros, convertendo-os em seres sociais.
(P. 195) O homem, então, como ser é o sujeito que constrói a sociedade e dentro desta as relações que nela produzem (sejam nacionais, locais ou internacionais). Trata-se, portanto de um protagonista que não espera que lhe deem um papel, nem que se estabeleça um cenário; tem uma prática social da qual se deriva a história e não o contrário.
Para concretizar, devemos dizer que este homem social “sujeito” da história e a sociedade, se agrupam também em diversas classes sociais; com uma posição determinada dentro da sociedade, de onde desenvolvem suas atividades, permitindo que o homem genérico adquira expressão concreta como sujeito primário, originário ou fundamental na sociedade e na história.
A ação dos sujeitos na história (primeiramente como classes sociais), tem um primeiro âmbito de expressão: a sociedade local com fronteiras geográficas bem estabelecidas conhecida como nação. Quando esta atividade transcende as fronteiras e se dirigem ao externo surge um amplo conjunto de relações entre dois ou mais sujeitos e que se localizam em dois ou mais sociedades nacionais, chamadas Relações Internacionais.
Os próximos elementos que permitem reconhecer a um sujeito das R.I são as seguintes:
(P. 196) 1. Dentro da totalidade em que se escrevem, se encontram hierarquizados segundo o lugar que ocupam.
2. Mediante sua práxis buscam transcender os limites da formação econômico-social, local ou nacional.
3. Tem a capacidade de participar organizadamente da vida econômica e nos processos jurídico-políticos e ideológicos da sociedade.
4. Em seu práxis social implementam e utilizam diferentes mecanismos para fazer valer seus interesses.
5. Tem uma ação contínua e prolongada no desenvolvimento histórico.
6. Desenvolvem novas atividades que se agregam as primeiras e que impõe uma prática original.
Considerando estes elementos chegamos à conclusão que os três principais sujeitos internacionais são: as classes sociais, o Estado e a Nação. Dos quais entendemos as classes sociais coo sujeitos primários, uma vez que são eles que conferem vida e determinam o Estado e a nação, que são concebidos como sujeitos secundários ou derivados.
  Bibliografia:
Lleana Cid Capetillo y Pedro Gonzáles Olvera: Los Sujetos de las Relaciones Internacionales; In Relaciones Internacionales, nos 33-34, UNAM, FCP y CRI México, Julio-deciembre 1984, pp. 127-130.

domingo, 28 de outubro de 2012

Fichamento: A Memória Evanescente de Leandro Karnal.


 Resumo:
O que são os documentos? Os documentos falam por si mesmos? Qual o trabalho do historiador? Imparcialidade existe? Um documento falso deve ser descartado?
Estas são algumas das questões apresentadas por Leandro Karnal e Flávia Tatsh. De maneira fácil e objetiva os dois historiadores fazem uma introdução na percepção da relação entre historiadores e documentos.
Boa Leitura!

Fichamento: A Memória Evanescente.
(P.09) O documento é a base para o julgamento histórico. Destruídos todos os documentos sobre um determinado período nada poderia ser dito por um historiador. Uma civilização da qual não tivéssemos nenhum vestígio arqueológico, nenhum texto e nenhuma referência por meio de outros povos, seria uma civilização inexistente para o profissional de História?
(P.10) Se o documento é tão importante, então: o que é um documento histórico? Iniciando da ideia mais difundida, o documento histórico é uma folha – ou várias – escrita por alguém importante. Ex: a carta de Pero Vaz de Caminha.
Carta de Pero Vaz de Caminha.
Essa visão omite a história do documento, ou seja, como determinado grupo e determinada época consideravam que aquela folha estivesse na categoria de um verdadeiro “documento histórico”. Ex. a carta de Pero Vaz de Caminha, nada mais era que uma simples carta perdida por durante duzentos anos na Torre do Tombo, até ser resgatada em 1773 e publicada em 1817. E aos poucos, no contexto da valorização nacional foram publicadas e republicadas durante todo os século XIX e XX.
(P.12) Ou seja, o crescimento da importância da carta de Caminha se deve ao crescimento do Brasil, do surgimento do nacionalismo, etc.
Em suma, o documento não é um documento em si, mas um diálogo claro entre o presente e o documento. Resgatar o passado e transformá-lo pela simples evocação. Todo documento histórico é uma construção permanente.
O documento também pode varar de acordo com os agentes que o leem. Ex. um funcionário da cultura do Estado Novo poderia ver em Caminha a certidão de nascimento do Brasil. Um indigenista a certidão de óbito de muitas populações indígenas. Mesmo ambos reconhecendo a importância do documento, ele pode gerar leituras opostas. Um documento, várias leituras. Além disso, o foco sobre o documento pode mudar de acordo com o recorte feito.
(P.13) Assim, um documento como a Carta de Caminha não tem importância em si, eterna e imutável, mas é um “link” que estabelecemos com o passado. Hoje é uma peça fundamental da história brasileira, mas pode no futuro voltar a ser perdido e considerado irrelevante.
A mutabilidade do documento tem relação com o sentido que o presente confere a tais personagens ou fatos.
(P.14) Um Conceito em Expansão.
Apenas no século XIX triunfou a ideia do documento como “prova histórica” superando o termo usado até então: monumento.
Rapidamente o documento foi reconhecido como fonte. Entretanto: a definição do que vem a ser um documento foi amplamente debatida. No século XIX a Escola Metódica tinha certeza de que um documento é, em essência, algo escrito e todo debate girava em torno de sua autenticidade ou não. Para os autores da Escola Metódica, Langlois e Seignobos, a questão central da história é a heurística documental, sendo única e exclusivamente o trabalho do historiador a busca, seleção, crítica e classificação documental.
A Escola dos Annales, colaborou para o alargamento da noção de fonte. Ao determinar que o historiador seria guiado por tudo que fosse humano.
(P.15) Surgiu a história sobre praticamente tudo, ampliando assim o termo documento histórico.
(P.16) Em síntese, a noção de documento ampliou-se muito mais do que os historiadores tradicionais queriam, mas, igualmente, não atingiu o patamar de “qualquer coisa”. Talvez a mudança mais expressiva do documento não esteja num novo objeto, mas num novo estatuto epistemológico da “verdade” no documento. Na visão tradicional da História, um documento falso era considerado nulo para a interpretação. Assim como o documento fantasioso. Com o advento da história nova até mesmo os documentos falsos ganham interpretação: por qual motivo se inventou este documento?
(P.18) Le papier souffre tout...
Os franceses têm um ditado de que “o papel aguenta qualquer coisa”. Com isso a cultura popular francesa expressa certo ceticismo quanto a papeis usados como documentos históricos. O papel aguenta qualquer coisa, ideia, sofre calado, jamais se rebela contra o autor. O que garante a autenticidade de um documento escrito?
Por mais que hoje, documentos falsos possam servir para análise histórica, a busca pela autenticidade continua fundamental.
(P.19) A falsificação atinge todo objeto de valor, com objetivos variados. Nazistas falsificavam objetos arqueológicos da civilização ariana, Stalin falsificava fotografias , etc.
Conclusão em aberto: O que é um documento histórico?
(P.20) Um documento é tudo aquilo que um determinado momento decidir que é um documento.
(P.21) Um documento é dado como documento histórico em função de uma determinada visão de época. Ou seja, o documento existe em relação ao meio social que o conserva. Mesmo que o conceito de documento se amplie ao limite, sempre haverá documentos mais importantes que outros.
(P.22) O “fetiche” pela fonte primária é uma verdadeira distorção do processo de produção da História (Keith Jenkins). De que esta fonte “falaria por si” e que ao historiador só caberia ler o inquestionável.
(P.24) Em síntese, documento histórico é qualquer fonte sobre o passado, conservado por acidente ou deliberadamente, analisado a partir do presente e estabelecendo diálogos entre a subjetividade atual e a subjetividade pretérita.
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Bibliografia:
KARNAL, L; TATSH; F. G. A Memória Evanescente. In: PINSHY, C.B; LUCA, T.R. de (orgs). O historiador e suas fontes. São Paulo: Contexto, 2009.