terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Análise do Livro Contato de Carl Sagan.

"Em Contato, o que está em jogo é mundo tal como conhecemos. Como quem faz uma aposta, Sagan nos convida a uma viagem assustadoramente fascinante pelo buraco negro que é a inteligência humana."
Escrito por Carl Sagan e Ann Druyan entre 1980 e 1981, publicado em 1985 e adaptado para o cinema em 1997, o livro Contato narra a história de Eleanor (Ellie) Arroway, desde sua infância até a maturidade quando se torna radio astrônoma...
Resumo da obra.
Em sua atividade de radio astrônoma, Ellie se empenha na busca de sinais de vida inteligente em outros planetas, o que é visto por outros astrônomos como um suicídio profissional, pois não existem garantias de êxito nessas buscas. Entretanto, enquanto trabalhava no Novo México, conseguiu captar ondas de rádio vindas de perto da estrela Vega, a mais brilhante da constelação de Lira e que fica a cerca de 26 anos luz da Terra.
Esta mensagem aos poucos é decodificada, revelando o seu conteúdo. Uma espécie de manual de instruções para a construção de uma máquina que até ser construída ninguém tinha idéia do que fazia. Muitos acreditavam que ela destruiria o mundo, ou servisse como uma espécie de cavalo de tróia alienígena, mas a hipótese mais aceita era de que ela seria uma nave espacial, pois continham cinco lugares[1].
Após diversos debates os acentos foram distribuídos entre algumas nações e a máquina posta para funcionar. Seus tripulantes, entre eles Ellie, são transportados para o centro do universo e entram em contato direto com os alienígenas que tomam a forma da pessoa que eles mais amam ou amarram na Terra. Para Ellie o alienígena se apresenta na forma de seu pai, Teodorre Arroway, falecido quando ela tinha nove anos.
Após esta magnífica experiência de cerca de 24 horas, eles regressam a Terra e são surpreendidos pela notícia de que eles ficaram dentro da nave por apenas 20 minutos e que ela, a máquina, não foi a lugar algum. Sem provas de sua viagem interestelar, eles são interrogados e acusados de ter ludibriado todo o planeta somente para manter seu projeto de pesquisa científico. É a partir desse momento que há uma inversão nos papeis e a cética Ellie se vê cercada de uma espécie de experiência espiritual idêntica a religiosa. Ela acredita fielmente ter passado por isso e não consegue provar.
Análise.
O grande trunfo desta obra é o de não ser uma ficção cientifica “barata”, cheia de homenzinhos verdes desembarcando de um disco voador, ou destruindo o mundo na véspera do dia de independência dos Estados Unidos. Sagan repleto com seu conhecimento cientifico nos dá uma aula de ciências e astronomia, fazenda de sua obra uma ficção sim, mas repleta de sobriedade.
O grande debate do livro ocorre no campo religião versus ciência. E como nosso mundo, tão atrasado em alguns aspectos, reagiria se realmente se descobrisse vida em outros planetas. Essa proposta fica clara através dos dois principais personagens do livro a cientista ateia Ellie e o Padre Palmer Joss, que vivem em constante atrito ideológico.
A obra apresenta a importância política que a religião tem em praticamente todo o mundo. Diversas decisões políticas somente são tomadas após a avaliação dela por religiosos influentes, para desespero de Ellie que vê na religião algo totalmente sem fundamento, inconsistente, sem provas, apenas uma histeria coletiva compartilhada por 95% da população do planeta.
Diversos embates filosóficos sobre a existência ou não de Deus, extremismo religioso e cientifico, se a religião merece todo esse poder, são travados durante o decorrer de todas as mais de quatrocentas páginas do livro.
Ao final do livro, quando Ellie e os outros tripulantes retornam de sua experiência intergaláctica sem nenhuma prova consistente de que realmente foram a algum lugar, o romance da uma reviravolta e a ciência que Ellie tanto acredita, não serve para explicar esse contato com seres de outro planeta. O ceticismo que a ciência tanto usa para analisar a religião e as suas chamadas experiências espirituais não pode ser usada por Ellie para explicar sua viagem rumo a Vega.
Sem as devidas provas, a única coisa que resta a Ellie é a fé de que ela realmente esteve 24 horas em outro planeta, enquanto na terra não se passaram vinte minutos. É a mesma convicção de um religioso, ele acredita fielmente em algo, acredita ser aquilo real e a sua única maneira de explicar é através da fé.
A meu ver, o final do livro sela um acordo de paz entre a ciência e a religião, representado pelos sentimentos de Ellie por Joss[2].
Bibliografia:
SAGAN; Carl: “Contato” São Paulo. Companhia das Letras. 2008. 434 páginas


[1] No filme de 1997,  apenas Ellie viaja.
[2] Algo que pessoalmente, como cético e admirador da ciência me deixou extremamente frustrado.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Cândido ou o Otimismo de Voltaire

Após ser expulso do castelo onde nasceu, Cândido inicia sua jornada em busca de sua amada Cunegundes e descobre que o mundo não é tão maravilhoso quanto ele pensou.
Voltaire (1694-1778).

François-Marie Arouet ou simplesmente Voltaire, é de longe o mais conhecido e celebrado homem de letras do século XVIII, ele foi à própria encarnação do iluminismo. Voltaire nasceu em 21 de novembro de 1694. Filho de um notário abastado recebeu uma ótima educação em um colégio jesuíta e pretendia dedicar-se ao magistério, mas patrocinado por Chauliu e pelo Marquês de La Fare, publicou seus primeiros versos...
Em 1717, acusado de ser o autor de um panfleto político, foi preso e encarcerado em Bastilha por quase seis meses. Foi nessa época que resolveu adotar o nome de Voltaire. Enquanto esteve na prisão escreveu Henriade e o esboço de Oedipe que em 1719 obteve grande êxito.
Em 1726, em consequência de um incidente com a nobreza, Voltaire foi novamente recolhido à Bastilha, de onde saiu sob a condição de deixar a França. Indo em exílio para a Inglaterra. Três anos depois regressou a França e publicou cinco livros em cinco anos. Nessa mesma época escreveu suas Lettres Philosophiques, que provocaram grande escândalo e obrigaram Voltaire a fugir para Lorena onde morou no Castelo de Madame Du Châtelet até 1749, quando volta a Paris já cheio de glória e conhecido em toda Europa.
Sem conseguir se fixar em parte alguma Voltaire vagou por diversas cidades da Europa, até que em 1758 adquiriu o domínio de Ferney, onde passou a viver em companhia de sua sobrinha Madame Denis. Durante vinte anos viveu ali, cheio de glória e amigos e é desse período que data o livro Cândido ou o Otimismo.
Em 1778, em sua viagem a Paris, foi entusiasticamente recebido. Morreu no dia 30 de março desse mesmo ano, aos 84 anos de idade.
A Obra.
Cândido ou o Otimismo é um conto filosófico de tom satírico, escrito por Voltaire no ano de 1759 em apenas três dias. Ao que tudo indica, foi escrito ainda sob a impressão do trágico terremoto de Lisboa. A obra é dividida em trinta curtos capítulos carregados de ironia.
De leitura rápida e fluente o leitor segue a vida de Cândido, um jovem que nasceu e cresceu em um formoso castelo. Ali seu mentor Dr Pangloss lhe ensina a filosofia do “melhor possível”. Para ele “nosso mundo era o melhor dos mundos possíveis”. “As coisas não podem ser de outro modo, pois tudo o que acontece tem uma finalidade, que inevitavelmente levará para o melhor possível”. Fica claro que filosofia seguida por Pangloss e ensina a Candido é a filosofia de Gottfried Leibniz.
Após um beijo correspondido por Cunegundes, o Barão de Thunder-tem tronckh, pai da donzela, expulsa Cândido de seu castelo onde este cresceu na mais pura inocência e não conhece as dificuldades da vida. A partir deste momento o enredo do livro é baseado em uma sucessão de desgraças, que vão pôr a prova a filosofia ensinada por Panglos.
O pano de fundo desta obra são os horrores e as crueldades do século XVIII, onde praticamente todos os personagens principais passam ou passaram por algum tipo de tormento físico ou psicológico.
E o principal objetivo de Cândido, que até mesmo o faz atravessar diversos continentes, e reencontrar a bela Cunegundes. Durante sua busca, ele encontra com diversos personagens falsos, ingratos, mesquinhos, mentirosos, etc. que servem como estereótipos dos mais variados grupos sociais como os religiosos, militares, escravos, governantes, nobres, teólogos, filósofos, etc.
Quando finalmente Cândido consegue encontrar em Istambul a bela Cunegundes, ela já está feia, amarga, não lembrava em nada a formosura de antes. Entretanto, este se caso com ela, pois havia prometido, e foram morar em uma casinha nos arredores, junto a Pangloss, Cacambo, Martinho e a Velha[1]. Lá cultivam uma pequena horta que dá o sustento da casa.
A grande lição do livro é dada ao final do texto pelo velho feirante turco, e faz Cândido pensar e negar a filosofia de Pangloss. O velho turco viveu a vida inteira em sua propriedade, não tem pretensões intelectuais e ensina a seus filhos que o trabalho afasta três grandes males: o tédio, o vício e a necessidade.
Desgastado pelo cotidiano, Cândido ouve mais uma vez Pangloss repetir seu mantra de que “tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis e que todos os acontecimentos até agora estavam encadeados da melhor forma possível no melhor dos mundos” e responde: “Tudo isso é muito bem dito, (...) mas vamos cultivar nosso jardim.”
Cândido desfrutou de um grande sucesso e escândalo. Imediatamente após ser lançado, o livro foi proibido por possuir as mais diversas formas de blasfêmia e hostilidade intelectual escondidos sob a ingenuidade de alguns personagens.
Voltaire era um especialista em escrever romances filosóficos com objetivos didáticos, e como fazia parte do movimento iluminista tinha o claro objetivo de lutar pela defesa da Razão contra as trevas, a ignorância e as superstições.
Esse é o objetivo principal do livro: em meio às trevas do mundo, tudo que podemos fazer é enfrentá-las com a força de nossa natureza racional, sem ilusões. Ensinar que, muitos ditos sábios como Pangloss, espalham idéias otimistas, tentando ludibriar cândidos com a esperança de mundos melhores.
Sites:
Bibliografia:
VOLTAIRE: “Cândido ou o Otimismo”. 1º ed. São Paulo: Folha de São Paulo, 2010 coleção livros que mudaram o mundo. Vol 17. 107 páginas.         

[1]  Cacambo é o criado de Cândido, Martinho companheiro de viagem de Cândido, A Velha é a criada de Cunegundes.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Karl Marx e o Trabalho Alienado/Estranhado

Análise de um pequeno trecho do livro de Karl Marx "Manuscritos Econômico-Filosóficos” , que trata sobre o trabalho alienado e seus males sobre o homem.


O Trabalho Alienado/Estranhado.
Para se entender este capítulo da obra Manuscritos Econômico-Filosóficos do filósofo alemão Karl Marx é necessário que se tenha em mente a seguinte linha de pensamento: a alienação do trabalhador ocorre em quatro etapas. Primeiro a alienação do trabalhador pelo produto. Segundo a alienação do trabalhador durante a produção do produto. Terceiro a transformação do homem em animal por não se identificar com seu trabalho. E quarto, o homem se contrapõe ao próprio homem...
Enquanto todos os economistas contemporâneos a Marx exaltavam o progresso da economia política, deslumbrados pelo progresso e pelo enorme desenvolvimento industrial, Marx nos apresenta o outro lado da moeda, a exploração e alienação do trabalhador. Buscando entender a conexão fundamental entre todo sistema de alienação e o sistema do dinheiro.
A alienação do trabalhador pelo produto: quanto mais o trabalhador cria/produz, mais ele torna-se miserável, transformando-se aos poucos em mercadoria. Em contra partida, a mercadoria que ele criou aos poucos se humaniza. O homem transforma-se em mercadoria e a mercadoria em homem. Isso acontece pelo fato do trabalhador se relacionar com o produto como um objeto estranho a ele. O trabalhador torna-se um escravo do objeto, primeiro ele é trabalhador depois sujeito físico.
A alienação do trabalhador durante a produção do produto: durante o processo de produção o trabalhador também é alienado. Primeiro que o trabalho é exterior ao homem, e este não se realiza enquanto trabalha, por isso o trabalhador só se sente em si fora do trabalho e quando um trabalho se realiza desta forma ele pode ser considerado como trabalho forçado.
A transformação do homem em animal por não se identificar com seu trabalho: o trabalhador então, só se sente realizado durante a realização de suas funções animais (comer, beber, procriar, etc) enquanto durante as suas funções humanas, este se vê reduzido a um animal.
Existem animais, como a formiga, o castor ou a abelha, que trabalham, mas este trabalho é uma atividade vital. O ser humano por sua vez possui uma atividade vital lúcida! Mas graças ao trabalho alienado, esta situação é invertida, e o homem trabalha como um animal, ou seja, para a sua subsistência.
O homem se contrapõe ao próprio homem: quando o homem se contrapõe a si mesmo, entra em oposição aos outros homens. Pois se o produto e o trabalho, que são estranhos a ele, não são do trabalhador, de quem serão? Simples, de outro homem. O trabalho e o produto do trabalho pertencem a outro homem distinto do trabalhador. Se a atividade é um martírio para o trabalhador é fonte de prazer do burguês. O trabalhador não passa de um escravo do próprio salário.
Embora a propriedade privada pareça à causa do trabalho alienado, ela é na verdade a conseqüência. De um lado ela é o produto do trabalho alienado e do outro o meio com o qual esse trabalho alienado se realiza.
Resultado da reunião do grupo de estudos ARENA MARX realizado em Assis no dia 28/11/2011
Referências:
MARX; Karl: “Manuscritos Econômico-Filosóficos” ed. Martin Claret, 2006 pág:110-122